Publicado em: 30/03/2021 às 08:25hs
O desafio é grande devido às limitações de recursos e terras, abrindo oportunidades para novas produções de alimentos e o aprimoramento da sustentabilidade das produções atuais.
Frente a esse cenário, a carne cultivada em laboratório tem ganhado espaço e aparenta ser um setor promissor. Mas afinal, como é possível criar carne em laboratório e quais os entraves, vantagens e desvantagens dessa produção?
Como é possível produzir carne cultivada em biorreatores?
Conhecida como carne in vitro, carne sintética, carne cultivada em laboratório ou até mesmo como carne limpa, a produção ocorre por meio do cultivo in vitro de células animais. Portanto, sem a criação e o abate animal.
A figura 1 esquematiza a produção de carne in vitro. Basicamente, células-tronco obtidas por meio de embrião ou músculo esquelético são cultivados em um biorreator com meio de cultura (ex: hidrolisados de cianobactérias, fatores de crescimento e vitaminas). Os micro transportadores são introduzidos nas células cultivadas para que se desenvolvam em fibras musculares específicas e mais largas.
Figura 1. Produção da carne cultivada em biorreatores.
Fonte: adaptado de Zhang et al. (2020).
Em 2013 foi produzido o primeiro hambúrguer do mundo feito à base de carne in vitro pela empresa holandesa Mosa Meat em Londres, com um custo de 330 mil dólares em um período de três meses. O hambúrguer foi produzido a partir de células-tronco colhidas do ombro de uma vaca (Bhat, Kumar e Fayaz, 2015).
Recentemente, no final de 2020, Cingapura foi o primeiro país no mundo a aprovar a produção e venda de carne cultivada. A startup americana Eat Just Inc. já comercializa carne de frango cultivada em biorreatores, em um restaurante de Cingapura.
A sustentabilidade da produção de carne in vitro
A produção de carne in vitro poderia beneficiar muito a produção de carne em termos de sustentabilidade. A figura 2 ilustra um comparativo entre os atuais sistemas de produção em relação ao uso de energia, água, terras e emissão de gases de efeito estufa avaliados na Europa.
Figura 2. Comparação dos sistemas de produção de carne em relação à produção de carne bovina (100%).
Fonte: Tuomisto e De Mattos (2011).
A tecnologia da produção de carne in vitro reduz consideravelmente a emissão de gases do efeito estufa, do uso de terras e de água. Em relação ao uso de energia, só fica atrás da produção de frangos. Portanto, a sustentabilidade dessa produção se destaca em relação aos sistemas vigentes de proteína animal.
Apesar dessas vantagens, há entraves e incertezas referentes à produção de carne cultivada.
O principal entrave é o custo de produção, que poderia ser reduzido drasticamente com o aumento da escala de produção (Bhat, Kumar e Fayaz, 2015). É necessário um investimento alto para viabilizar a produção em larga escala.
Contudo, há expectativas de que até o fim de 2021, o custo de um hambúrguer seja reduzido a 10 dólares, e que o tempo de produção seja reduzido para três semanas.
Quanto às incertezas relacionadas à carne cultivada, é possível que a alta taxa de replicação celular favoreça o desenvolvimento de células cancerígenas.
Em relação aos teores nutricionais, ainda não se tem certeza de que seu consumo suprirá as mesmas exigências nutricionais como a carne convencional, principalmente tratando-se dos níveis de micronutrientes e ferro.
Além disso, há divergências científicas a respeito da reprodução dos diferentes cortes de diferentes espécies em laboratório, o que poderá ser um processo que demandará muito tempo ou até mesmo seja impossível (Chriki e Hocquette, 2020). Assim, a reprodução de certas características da carne, como a textura e marmoreio, são um desafio nessa produção.
O setor de carne cultivada já conta com 50 empresas em 19 países. Cerca de um terço delas são recentes, fundadas em 2019. A maioria está na Europa e nos Estados Unidos, sendo que na América do Sul, atualmente, há somente uma, localizada na Argentina.
Apesar de considerações como “a revolução da carne” ou então “o futuro da carne”, esse modelo de produção deve ser visto como suplementar e não como substituto dos atuais sistema de produção de proteína animal. Há questões relacionadas ainda à aceitação do público e à certificação de segurança de alimentos.
Por outro lado, as produções tradicionais de proteína animal têm procurado e caminhado para produções sustentáveis, principalmente visando a melhor utilização de recursos e o bem-estar animal.
por Rafael Suzuki - Scot Consultoria
Fonte: Scot Consultoria
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