Outros

Cooperativas nascem para atacar gargalos porteira afora

"Nossa família teve a felicidade de fazer parte de duas cooperativas, cada uma com objetivos diferentes, mas que preenchem duas lacunas fundamentais: uma cuida da parte de armazenagem e outra supre a aquisição de insumos e venda da produção", contou


Publicado em: 24/09/2012 às 16:30hs

Cooperativas nascem para atacar gargalos porteira afora

O produtor fala ainda em mudanças dentro da própria família, desde que foi tomada a decisão de integrar o grupo dos cooperados. "Além de toda facilidade nos negócios que essas cooperativas proporcionam, temos nelas uma extensão da nossa família. Todos têm um objetivo em comum", frisou.

E as próprias cooperativas do município desfrutam de um momento favorável. A explicação para o sucesso da Coacen - Cooperativa Agropecuária e Industrial Celeiro do Norte - vem do presidente Gilberto Peruzi.

"Da porteira para dentro nosso produtor é muito competente e não precisa de interferência. Agora, da porteira para fora ele precisa de assistência porque busca muito a produção no campo e esquece da comercialização. É aí que a cooperativa entra", contextualizou ao Agrodebate.

Peruzi lembra que a cooperativa deu início às atividades no ano de 2005 com objetivo de auxiliar o produtor nas operações de compra e venda. Eram 13 famílias, mas o número avançou para 23 e atualmente conta com 45 grupos familiares, que representam em torno de 154 produtores associados de Sorriso e região. Por ano, os cooperados produzem 4 milhões de sacas de soja e milho.

Cooperativas nascem para atacar gargalos porteira afora

 
Vantagens fiscais e ganhos em escala têm atraído um número cada vez maior de produtores rurais de Mato Grosso a aderirem ao cooperativismo. Eles buscam principalmente suprir as deficiências e aumentar a competitividade da chamada porteira para fora. O potencial produtivo do estado - atualmente o maior produtor brasileiro de grãos - deu um empurrão na atividade. Somente nos últimos dez anos, o cooperativismo cresceu ferozmente em níveis de até 200%, puxado principalmente pelo campo, revela o Sindicato e Organização das Cooperativas Brasileiras no Estado (OCB/Sescoop).

Quem apostou neste modelo diferenciado de organização agora colhe bons resultados. Desde a década de 1980, a família Piccoli vive em Sorriso, município a 420 quilômetros de Cuiabá, e onde planta soja e milho. Hernandes Piccoli, de 31 anos, responsável por tocar os negócios da família, conta que só foi possível crescer graças à união com outros agricultores.

Conforme Gilberto Peruzi, anualmente a capacidade de compra da cooperativa chega à cifra de US$ 80 milhões. A aposta é um novo modelo de cooperativismo focado 100% no cooperado.

"Todo e qualquer resultado é repassado integralmente para o associado. Não é retido nenhum valor na venda e nem na compra de suprimentos. Talvez esteja aí o segredo. Nosso associado é desonerado já no ato da decisão de sua negociação", lembra o presidente da Coacen. A busca por parceiros comerciais também ajuda a motivar o crescimento do produtor. Em média, a compra de insumos para a safra ocorre com antecedência de até dois anos.

De forma simples, João Carlos Turra resume o motivo que levou também a Cooperativa Agropecuária Terra Viva (Cooavil) a tornar-se o que é. "O produtor começou a atuar cem por cento na cooperativa e o sucesso vem junto. Mas é preciso ter um espírito de cooperativismo". Produtor rural em Sorriso, Turra preside a cooperativa com atuação direta no recebimento e armazenamento de grãos.

As atividades foram iniciadas ainda em 2006, com a construção dos armazéns. Hoje, em uma área de cinco hectares são três silos com capacidade para recebimento de 1,5 milhão de sacas. Cerca de 40 cooperados contam com uma área de 70 mil hectares de produção de soja, 50 mil hectares de milho e cerca de 6 mil de algodão. Representam 12% da economia agrícola do município.

Diante do crescimento, planos de ampliação já são colocados em prática. "Hoje estamos com capacidade para um milhão e meio de sacas e já decidimos fazer mais um silo de cem mil sacas. Todo ano crescemos um pouco e precisamos evoluir, melhorar de acordo com nossas condições", prospectou.
 
A difícil transição

O professor da Universidade do Missouri, nos Estados Unidos, Fábio Chaddad, considerado um dos principais nomes do assunto, diz que as cooperativas atuais dão certo porque foram profissionalizadas e deixaram para trás o modelo paternalista. Mas a transição entre um ciclo e outro - ocorrido especialmente nas últimas décadas - não foi de forma tranquila.

"As cooperativas do passado eram paternalistas, dependentes de subsídio do governo e pouco transparentes, com baixo envolvimento dos produtores. Realmente não tinha como dar certo", analisa.

Um novo modelo de gerenciamento ganhou espaço. "Cooperativas modernas não dependem do governo, são administradas e geridas como negócios e empresas, além de terem grande envolvimento dos produtores", afirmou Chaddad, ao Agrodebate.
 
Em Mato Grosso, apesar do título de maior produtor nacional de soja e milho segunda safra, ainda é tímida a participação de produtores deste setor no cooperativismo. Uma pesquisa realizada pela Associação dos Produtores de Soja e Milho (Aprosoja) mostrou que na safra 2010/11 o percentual de dos produtores de soja e milho que participavam de cooperativas chegava a 13%. Conforme o levantamento, juntos, plantavam 26% das lavouras. Enquanto isso, no grupo dos agricultores do algodão, 90% são cooperados.

Carlos Fávaro, presidente da Aprosoja mato-grossense, diz que a baixa adesão deve-se aos traumas do passado.

"Neste modelo antigo a cooperativa centralizava o poder, as compras, decidia os créditos. Não era um modelo transparente", avaliou. Mas o setor tem uma meta audaciosa. Em um período de no máximo dez anos elevar de 13% para 50% o percentual de produtores cooperados dentro da cadeia da soja e milho.

"Atrativos são inúmeros e sem dúvidas garantem mais rentabilidade. O desafio é aparar as arestas e vencer as dificuldades", reconhece o representante da classe produtora.

De acordo com a OCB Mato Grosso, até 2011 eram 57 cooperativas ativas do ramo agropecuário, número 46,1% maior que o total existente em 2000, quando eram 39. Atualmente, mais de 10,2 mil pessoas fazem parte deste sistema de associação.

Presidente da OCB/Sescoop no estado, Onofre Cezário, frisa que 1,1 milhão de pessoas estão envolvidas direta ou indiretamente com as cooperativas do estado, representando 34% da população da unidade federada.

Sessenta e cinco por cento do leite captado no estado vêm de cooperativas. "O principal ramo de atuação das cooperativas do estado é o agropecuário, seguido pelo sistema de crédito e depois saúde", afirmou.

Enquanto isso, no Brasil as cooperativas agropecuárias somam 1.523, perfazendo um universo de 969.541 associados.

Fundamental


Hernandes Ortiz, presidente da Cooperativa Agroindustrial do Vale do Ivinhema (Coopavil), em Mato Grosso do Sul, diz que o cooperativismo é um divisor de águas para o agronegócio brasileiro, especialmente no Estado. "Quando trabalhamos juntos somos muito fortes. Um exemplo disso é o manifesto contra a importação de leite, que nasceu daqui, das conversas entre os cooperados", comenta.

Ortiz diz que uma cooperativa representa para seus associados mais do que uma instituição que os representa comercialmente. "As cooperativas têm também um papel social importante, elas investem em capacitação e treinamento para que os cooperados agreguem valor aos seus produtos e possam gerar mais renda", analisa, completando que Coopavil tem 350 associados em seis municípios do Vale do Ivinhema.

Fomentando sustentabilidade


Em São Gabriel do Oeste, no norte de Mato Grosso do Sul, uma iniciativa da Cooperativa Agrícola do município (Cooasgo), ajudou a solucionar um dos principais problemas dos criadores de suínos da região, dar uma destinação aos dejetos dos animais. Com a implantação de biodigestores os excrementos são transformados em biogás, que é usado para gerar energia para abastecer as propriedades e também é queimado para gerar créditos de carbono.

O presidente da Cooasgo, Jair Antônio Borgmann explica que a implantação dos biodigestores nas granjas do município começou em 2005 e foi um marco para a atividade. "O então presidente da cooperativa estava fazendo uma viagem ao exterior e visitou uma granja que tinha um biodigestor. Fez contato com a empresa responsável pelos equipamentos [a canadense Agcert], que se interessou em se instalar no município. Foi feita uma parceria da entidade com a empresa e ela começou a implantar os biodigestores nas propriedades", comenta.

Borgmann relata que a implantação dos biodigestores é toda custeada pela empresa canadense, que, em contrapartida, tem o direito de comercializar os créditos de carbono no mercado internacional, repassando 10% dos valores obtidos para os produtores. O presidente diz que através da iniciativa foi solucionado o principal problema dos criadores que era dar uma destinação aos dejetos do suínos, reduzindo o impacto ambiental e transformando uma atividade poluidora em uma produção sustentável.

"Inicialmente a maior parte do gás era simplesmente queimada, mas com o passar do tempo os produtores perceberam que era um desperdício. Modificaram os motores elétricos usados nas propriedades e passaram a utilizar o gás como fonte de energia. Algumas propriedades se tornaram autossuficientes em energia elétrica. A própria Cooasgo, que antes tinha um gasto de R$ 30 mil com energia, hoje gera toda a energia que consome", ressalta.

O presidente diz que atualmente a atividade responde por cerca de 40% da arrecadação de impostos do município. "Temos 193 funcionários nas granjas e 1.270 no frigorífico que faz o abate dos animais. Em uma cidade de 22 mil habitantes esse é um número bem expressivo. Até 2015 pretendemos ampliar o número de abates diários, que hoje está na casa dos 2,2 mil para 3 mil suínos o que vai fazer com 2,5 mil pessoas sejam empregadas diretamente pelo sistema, que vai aumentar para 50% sua participação na arrecadação de tributos", conclui.

Fonte: Agrodebate

◄ Leia outras notícias