Publicado em: 11/02/2019 às 01:00hs
A décadas, estes bordões foram sonoramente e largamente utilizados, pela classe rural brasileira e pela sociedade em geral. É evidente que temos vocação natural para a agropecuária e todos os negócios relacionados as suas cadeias produtivas dentro e fora de nosso país, somos reconhecidos como celeiro mundial. Porém, tal posicionamento invejável de hoje, fora alcançado com muita luta, suor e lágrimas por parte daqueles que serviram integralmente ou boa parte de suas árduas vidas as atividades do ramo da agricultura, sempre primando pela família e seus valores, bem como pela introdução de novas tecnologias no campo, pela farta produção aliada a qualidade, focada em prover a alimentação interna e externa, nos mais inóspitos locais do globo. Sim, diversificação de produtos do agro, agora made in Brasil.
Ocorre, que os triunfos que vemos hoje, no que se refere a agricultura brasileira, com ampla divulgação pela mídia escrita e falada dentro e fora de nossas porteiras, nem sempre reluziu a ouro, como nos tempos atuais em que vivemos de prosperidade e bonança. Tempos estes que espero que permaneçam.
Existiu um período sombrio e extremamente tumultuado, onde toda a classe rural nacional, desde o pequeno agricultor familiar aos mais fortes latifundiários do país, assim como empresas agropecuárias, empresas de frutas, usinas de cana de açúcar, cooperativas entre outras pessoas jurídicas enfrentaram tempos de verdadeiras vacas magras. Com o perdão do trocadilho, mas realmente tratou-se de um verdadeiro armageddon, ou como queiram um fim dos tempos! Esse período infernal para o agronegócio foi a parte final dos anos oitenta, e início dos anos noventa, mais precisamente entre 1987 e 1990 do qual os leitores mais velhos irão lembrar como ontem, principalmente por causa da inflação mensal frequente e sucessiva na casa dos dois dígitos.
Todos sabemos que quem trabalha no agronegócio é um verdadeiro herói diuturnamente. Temos que é cristalino que quem atua nesta área é um bravo soldado, que carrega uma granada sem pino em uma de suas mãos todo santo dia.
Explico detalhadamente: No agronegócio abre-se mão de horários. Acordando por vezes mais cedo que o próprio galo, dormindo cedo, para no próximo dia exercer novamente as lidas no campo. Não se tira férias por anos. Não há luxo ou glamour, vive-se uma vida regrada e com comprometimento a terra. Compromissos por vezes são desmarcados entre amigos e familiares. No momento de plantio e de colheita os dias realmente não parecem ter vinte e quatro horas, mas apenas vinte. Existe a dependência das condições climáticas, que nem sempre são favoráveis. Existem as dificuldades na concessão de novas linhas de crédito rural, e de renegociação das já existentes. Assim como de cobranças indevidas, vendas casadas, seguros não cobertos e outras intempéries desfavoráveis aos agricultores causadas pelo sistema financeiro brasileiro. Somado a isso, ainda temos a enorme burocracia estatal, plano safra sempre insuficiente, adequações e fiscalizações trabalhistas e ambientais a todo tempo, cobranças tributárias, falta de infraestrutura e logística adequadas para armazenagem e escoamento da produção superior a cada ano que passa. Por fim, também muito importante é a questão dos custo de insumos e maquinários importados que variam com base no câmbio, assim como a cotação diária dos produtos finais do agro que dependem ainda das variáveis da quantidade de produção e demanda dentro e fora do país. Tudo isso, sem contar o velho trabalho duro na lida diária.
Voltando a época mencionada anteriormente, a justificativa para tantos problemas e verdadeira frustração para o agronegócio brasileiro naquele momento, que se postergou por infindáveis anos só teve um nome, o malfadado e temido PLANO COLLOR RURAL.
Em 15 de Março do ano de 1990, o Presidente Collor promulgou o PLANO COLLOR, que na área rural trouxe severos problemas no setor agrícola por diversos anos, sendo também conhecido como PLANO COLLOR RURAL.
Referido plano econômico, na área rural, afetou de modo temerário dezenas de milhares de agricultores, empresas rurais e cooperativas em todo território nacional. O que aconteceu foi que simplesmente da noite para o dia, após a promulgação do PLANO COLLOR RURAL, a grande maioria dos contratos de crédito rurais de custeio e de investimentos, contratados entre pessoas físicas e pessoas jurídicas junto ao Banco do Brasil S.A, que se encontravam em vigência ativa no mês de Março de 1990, foram cobrados quase que em sua totalidade ilegalmente a maior pela instituição financeira, diferentemente do que se havia pactuado entre as partes.
Com a promulgação pelo governo federal do PLANO COLLOR RURAL, o Banco do Brasil S.A, banco então do agronegócio brasileiro, que entre os anos de 1987/1990 respondia por cerca de 85% do crédito agrícola nacional; unilateralmente, sem nenhuma justificativa legal deixou de cobrar o índice da caderneta de poupança que estava positivado nos contratos de créditos rurais entre as partes. A casa bancária a seu bel prazer cobrou índice diverso do pactuado, o que resultou em uma diferença paga a maior em favor do banco de 43,04%. Pasmem em plena época de hiperinflação!
Resultado disso, fora que milhares de pessoas físicas e pessoas jurídicas com contratos de crédito rurais realizados com o Banco do Brasil S.A, os quais se encontravam ativos no mês de Março de 1990, simplesmente não conseguiram honrar em dia com seus pagamentos. Pois, a casa bancária descasou os rendimentos da caderneta de poupança dos índices de reajuste que deveriam ter sido cobrados dos contratos de financiamentos rurais. Ou seja, ao invés do banco do agronegócio brasileiro ter sido correto e cobrado apenas o índice da caderneta de poupança que estava previsto no contrato de crédito rural entre as partes, após a promulgação do PLANO COLLOR, este cobrou indevidamente o índice de reajuste denominado IPC (Índice de Preços ao Consumidor), o que resultou em uma cobrança a maior para pessoas físicas e jurídicas no importe de 43,04% de seus contratos de financiamentos rurais de custeio ou investimento com o Banco do Brasil S.A.
Temos que se um cliente da instituição financeira tivesse um contrato de financiamento rural de custeio ou de investimento junto ao Banco do Brasil. S.A, contratado antes de março de 1990, e que este se encontrava ativo em março de 1990, com pagamento realizado posteriormente a esta data. O mesmo terá direito a restituição de tais valores pagos indevidamente. Exemplificando:
Devedor devia ao Banco do Brasil S.A:
CZ$ 100.000,00 ou NCZ$ 100.000,00 (cem mil cruzados ou cruzados novos)
O Banco do Brasil S.A deveria ter cobrado o índice da caderneta de poupança, previsto nos contratos de financiamentos rurais de custeio ou de investimento, o que resultaria em um correto aumento da dívida para:
CZ$ 141.280,00 ou NCZ$ 141.280,00 (cento e quarenta e um mil duzentos e oitenta cruzados ou cruzados novos).
Ocorre que o Banco do Brasil S.A cobrou ilegalmente, índice diverso do pactuado nos contratos de financiamentos rurais de custeio ou investimento celebrados entre as partes. Ou seja, com a cobrança do IPC (Índice de Preços ao Consumidor), este cobrou ilegalmente 43,04% a maior, o que gerou um aumento ilegal da dívida para:
CZ$ 184.320,00ou NCZ$ 184.320,00 (cento e oitenta e quatro mil trezentos e vinte cruzados ou cruzados novos).
O mesmo exemplo pode ser refletido em sacas de soja, milho ou outro produto. Notemos:
Devedor devia ao Banco do Brasil S.A:
1.000 sacas de soja, milho ou outro produto.
Com a promulgação do PLANO COLLOR o Banco do Brasil S.A deveria ter cobrado o índice da caderneta de poupança, previsto nos contratos de financiamentos rurais de custeio ou de investimento, o que resultaria em um correto aumento da dívida para:
1.412 sacas de soja, milho ou outro produto.
Ocorre que o Banco do Brasil S.A cobrou ilegalmente, índice diverso do pactuado nos contratos de financiamentos rurais de custeio ou investimento celebrado entre as partes. Ou seja, com a cobrança do IPC (Índice de Preços ao Consumidor), cobrou ilegalmente 43,04% a maior, o que gerou um aumento ilegal da dívida para:
1.843 sacas de soja, milho ou outro produto.
Hoje, devido a uma Ação Civil Pública, ajuizada pelo Ministério Público Federal é possível conseguir judicialmente a devolução destes valores cobrados a maior pelo Banco do Brasil S.A acrescido de juros e correção monetária de mais de 25 anos, o que resulta em ótimos valores a serem recebidos pelos prejudicados. Para quem no momento não possa ajuizar a ação competente contra o Banco do Brasil S.A, este poderá direcionar a ação judicial contra a União, para que esta efetue o pagamento de tais valores, visto que a mesma fora condenada solidariamente na Ação Civil Pública em questão.
Trata-se de um direito já discutido e pacificado pelo STJ do agricultor e de pessoas jurídicas ativas e inativas prejudicadas a buscarem tal ressarcimento na via judicial, posto que tal problemática ceifou muitas famílias na época, onde inúmeras máquinas e propriedades rurais foram colocadas a venda espontaneamente ou de modo forçado através de leilões para fins de saldar as dívidas ilegais junto ao Banco do Brasil S.A em plena época de hiperinflação, somado ao fato de existir prisão por dívida nos idos de 1987 a 1990, bem como por muitos empregos e sonhos terem se despedaçado pelo caminho, já que muitos não conseguiram saldar suas dívidas rurais, tendo assim deixado a atividade do agronegócio exclusivamente pela ganância do Banco do Brasil S.A.
Lembrando que quando da efetivação da contratação dos financiamentos rurais, uma via da cédula rural ficava com o cliente, uma via da cédula rural ficava com o Banco do Brasil S.A e uma via da cédula rural ficava registrada e arquivada obrigatoriamente no cartório de registro de imóveis. Na grande maioria dos casos, tendo em vista o lapso temporal transcorrido o cliente não tem mais essa documentação guardada em sua posse. O Banco do Brasil S.A não fornece a mesma. O ideal neste caso é que o prejudicado ou seus herdeiros solicitem a cópia da cédula rural integral junto ao cartório de imóveis em que foi registrado o financiamento rural, para que então possa ser analisado e comprovado o direito do cliente, assim como para fins de apurar o valor exato a receber do Banco do Brasil S.A ou da União, conforme o mesmo optar na ação judicial correspondente.
Exerça seus direitos, procure um profissional habilitado e especializado para que este possa lhe orientar. Todos juntos pelo fortalecimento do agronegócio.
PAULO CESAR FURLANETTO JUNIOR – Advogado Rural e do Agronegócio com atuação em demandas de massa em todo o país - Sócio Fundador do Escritório Advocacia Furlanetto, com matriz em Joaçaba/SC. Professor da ESA – Escola Superior do Agronegócio. Membro Fundador e Coordenador do IBDAGRO para Santa Catarina – Instituto Brasileiro de Direito do Agronegócio.
Fonte: Escritório Advocacia Furlanetto
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