Publicado em: 26/11/2019 às 00:00hs
Recuperação judicial
Recentemente, tratamos em um texto, sobre a recuperação judicial para aquelas situações, onde, infelizmente a gestão leva ao endividamento bancário, por questões climáticas e de mercado.
O texto anterior apenas abordou brevemente o que é a recuperação judicial, como funciona e se era possível ou não ao produtor rural se utilizar desta ferramenta jurídica.
Nesta oportunidade trazemos algumas novidades e mais algumas reflexões ao produtor e empresário rural que tem dúvidas sobre a recuperação judicial, muito discutida em diversas reportagens e matérias.
Obstáculos
A respeito da viabilidade e outros fatores de decisão, é importante dizer que se o obstáculo seria o aumento dos custos, supressão de financiamentos e etc., devemos considerar também que parece estar acontecendo um forte lobby para impedir a utilização da recuperação judicial para o produtor pessoa física.
Isto porque o financiamento rural pelas cédulas de crédito rural está abaixo do suficiente e as linhas de crédito do BNDES também não suportam a demanda de renegociação, pois bancos resistem em cumprir normativas e aplicar as diretrizes de concessão, prazo e negociação do crédito rural.
Ao que parece, pretendem esticar a corda para ver se alguém continua segurando, mas neste caminho, pode ser que muitos acabem entrando em complicações financeiras, como temos visto execuções de dívidas contra produtores em “quebra de safra”, lavouras financiadas por cédula de crédito rural e, ao apresentar pedidos de prorrogação da dívida, bancos negam este direito, mesmo fundamentado nas normativas existentes. Por isso, uma das alternativas pode ser a recuperação judicial.
A novidade
A novidade é que a 4ª turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em julgamento recente, trouxe importante precedente a favor do produtor rural pessoa física que entrar com pedido de Recuperação Judicial.
No caso, envolvendo o Grupo JPupin, a discussão era incluir no processo de recuperação os débitos contraídos por produtor rural como pessoa física, antes mesmo de se inscrever na Junta Comercial.
A 4ª turma do STJ então entendeu que, as dívidas contraídas pela pessoa física antes da inscrição na Junta Comercial podem ser incluídas, já que o referido registro tem natureza meramente declaratória e não constitutiva.
Mesmo assim, ainda padecem algumas dúvidas neste processo de decisão de quem se encontra endividado e quer saber mais a respeito da recuperação judicial, por isso esclarecemos.
Qual o custo do processo de recuperação judicial?
Responder essa questão não é uma tarefa difícil, pois os “custos” dependem diretamente do montante da dívida envolvida na futura renegociação. As despesas para propositura da ação (custas judiciais, honorários do administrador judicial, custas recursais, dentre outras) são calculadas com base no valor do passivo, ou seja, no montante da dívida. Obviamente, como em qualquer ação judicial, pode no decorrer do processo surgirem custos não previstos, porém os principais são possíveis de mensurar.
Quais os documentos devem ser apresentados para ingressar com o pedido de recuperação judicial?
O art. 51 da Lei Federal no. 11.101/05 traz uma infinidade de documentos que devem instruir o processo. A grande maioria desses documentos é de caráter contábil, de fácil acesso, pois alinhados com o próprio desenvolvimento da atividade comercial rural. Além da documentação contábil, a legislação pede que sejam trazidos ao processo à lista dos credores, os processos que são movidos contra o devedor, os títulos protestados, certidões e as causas que desencadearam a situação de sua crise econômico-financeira.
Como será a negociação dessas dívidas?
O processo de recuperação judicial é justamente uma alternativa para quem não consegue mais negociar suas dívidas em virtude da resistência dos credores.
Basicamente, a renegociação dos débitos passa pela apresentação de um plano de recuperação por parte do devedor. Nesse plano, o devedor expõe aos seus credores o prazo, a forma e o tempo em que ele poderá se capitalizar para pagá-los. Após a apresentação do “plano”, será designada uma data para realização de uma assembleia geral, onde se discutirá a viabilidade do pagamento dos débitos serem realizados na maneira em que foi colocada no plano.
É nessa assembleia que a negociação efetivamente ocorre, mediante ajustes no plano, nas condições nele descritas e etc., tudo para alcançar o fim maior, que é a recuperação das atividades do devedor.
Quais os benefícios que o processo pode trazer ao Produtor Rural?
Sem sombra de dúvidas, o principal benefício é a manutenção das atividades empresariais que está sendo engolida pelas dívidas, correndo o risco de serem paralisadas ou até mesmo inviabilizadas por execuções, cobranças, penhora de bens, equipamentos e faturamento.
Outro grande benefício é a possibilidade de renegociação de débitos com credores que não mais possuem interesse em incentivar a atividade ou liberar recursos para sua manutenção.
Essa negociação tem por principal objetivo colocar a dívida dentro de um patamar pagável e isso se consegue com carência, diminuição de juros, deságio, entre outras inúmeras formas de redução do passivo.
Em miúdos, com o deferimento da recuperação, o devedor pode respirar um pouco e cuidar mais do seu negócio ao invés de ficar se preocupando com o resguardo de seus bens, haja vista que estes estarão assegurados pela suspensão dos processos promovidos contra ele.
Como o mercado e os financiadores da atividade rural poderão reagir ao pedido?
O produtor rural tem o medo corriqueiro e muito compreensível de que pedindo a recuperação judicial os bancos e demais financiadores de suas atividades parem de fornecer crédito.
A verdade é que o agronegócio é um mercado extremamente amplo e que possui uma série de investidores fora do eixo comum (bancos e etc.) que estão prontos para tomar o lugar de quem largar a posição. Deve ser lembrado também, que o pedido de recuperação judicial tem por objetivo dar um fôlego para quem estiver endividado retomar sua saúde financeira, em razão disso o fornecimento dos serviços e da própria produção acaba sendo impactado positivamente, pois com a renegociação do débito o devedor tem um campo maior para melhorar sua produção.
É preciso abrir uma pessoa jurídica para ingressar com a recuperação judicial? Qual modalidade de empresa é melhor e menos custosa?
Em virtude deste novo entendimento do STJ, a resposta é sim!
Isso porque, apesar do registro mercantil do produtor rural segundo a legislação civil ser uma faculdade e não uma obrigatoriedade, entende o Superior Tribunal de Justiça que para cumprir com os requisitos da lei de recuperação judicial e falência, deve ele, produtor, fazer sua inscrição na junta comercial.
Quanto a melhor opção de pessoa jurídica a ser aberta para cumprimento desta exigência, para alcançar uma conclusão sobre isso se faz necessário mergulhar nas individualidades de cada produtor, um estudo bem feito do negócio pode, inclusive, trazer benefícios tributários.
São estas algumas das muitas dúvidas que surgem no momento de decidir pela recuperação judicial, deixando o espaço aberto para mais discussões.
Texto escrito em coautoria com o amigo advogado Leonardo Flores Sorgatto, especialista em Direito Tributário, Direito Civil e em Recuperação Judicial de empresas.
Pedro Puttini Mendes - Advogado (OAB/MS 16.518), Consultor Jurídico e Professor nas áreas de Direito Agrário, Ambiental, Família e Sucessões. Graduado em Direito (2008) e Mestre em Desenvolvimento Local (2019) pela Universidade Católica Dom Bosco. Pós-graduação em Direito Civil e Processo Civil pela Anhanguera (2011). Cursos de Extensão em Direito Agrário, Licenciamento Ambiental e Gestão Rural. Apresentador do quadro "Direito Agrário" para o Canal Rural. Colunista de direito aplicado ao agronegócio para a Scot Consultoria. Organizador das obras "Agronegócio: direito e a interdisciplinaridade do setor" (Editora Contemplar, 2018) e "O direito agrário nos 30 anos da Constituição de 1988" (Editora Thoth, 2018). Escreveu em coautoria as obras "Direito Ambiental e os 30 anos da Constituição de 1988" (editora Thoth, 2018); "Direito Aplicado ao Agronegócio: uma abordagem multidisciplinar" (Editora Thoth, 2018); "Constituição Estadual de Mato Grosso do Sul - explicada e comentada" (Editora do Senado, 2017). Membro e Representante da União Brasileira de Agraristas Universitários (UBAU), Membro fundador da União Brasileira da Advocacia Ambiental (UBAA). Foi Presidente da Comissão de Assuntos Agrários e Agronegócio da OAB/MS e membro da Comissão do Meio Ambiente da OAB/MS entre 2013/2015.
Fonte: Scot Consultoria
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