Publicado em: 17/09/2021 às 08:20hs
Essa maior produção gerou um aumento das necessidades nutricionais dessa categoria animal. Somado a esse fato, a seleção para menor deposição de gordura nos suínos para o abate direcionou os esforços do melhoramento genético para a obtenção de matrizes com menor apetite. Isso trouxe como consequência relevante uma degradação do status nutricional nas reprodutoras na fase de lactação. Essa mobilização de reservas corporais na forma de gordura e até mesmo músculo, quando em excesso (mais de 10-12% de perda de peso), causa um impacto já conhecido no desempenho reprodutivo subsequente, com forte possibilidade de influenciar negativamente o intervalo desmame-cio aumentando, portanto, os dias não produtivos e diminuindo a taxa de parto e o número de leitões nascidos totais no parto subsequente.
Existem evidências científicas mais recentes que apontam para, além dos indicadores anteriormente citados, impacto nas características dos folículos ovarianos e potencialmente no aumento da variação do peso dos leitões ao nascimento. Por essa razão existe a justificativa de aumentar o mais rápido possível a oferta de ração e, portanto, o consumo pelas fêmeas lactantes para diminuir essa mobilização de reservas corporais, sobretudo músculo, pensando não somente no impacto potencial no ciclo reprodutivo atual, mas também no ciclo reprodutivo futuro.
Deficiências nutricionais de curta duração, apesar de não diminuir a produção leiteira, podem causar mudanças agudas ou crônicas no equilíbrio dos hormônios envolvidos nos fenômenos reprodutivos. Apesar dessas mudanças na composição corporal serem sutis ou imperceptíveis seus efeitos negativos podem reduzir a taxa de ovulação e a sobrevivência embrionária. Essa subnutrição em qualquer semana da lactação pode reduzir o tamanho da leitegada subsequente.
Quando comparamos os sistemas de produção percebemos diferenças importantes no consumo de ração na primeira semana de lactação. A principal razão é justamente a adoção de um programa de incremento gradual de oferta distinto em cada granja. O problema é que em muitos casos essa estratégia pode reduzir o consumo em cerca de 15% ou mais quando comparado com abordagens mais agressivas de oferta de ração. Isso traz como consequência termos um grande contingente de matrizes em déficit nutricional de energia e aminoácidos nesse período. As fêmeas até não diminuem sua produção leiteira, mas perdem peso mobilizando suas reservas corporais.
A oferta restrita de ração no início da lactação é um paradigma para aqueles que pensam que uma oferta excessiva de ração nessa etapa poderia causar edema de úbere, hipogalaxia, diarreia nos leitões e constipação nas fêmeas, podendo fazer com que as mesmas abandonassem a alimentação no meio ao final da lactação. A avaliação por softwares de gestão de produtividade para as granjas usando um grande número de registros mostra que ao compararmos a oferta gradual com a oferta mais rápida a primeira gera leitegadas com peso mais baixo, intervalo desmame-cio maior e com mais variabilidade.
Os esforços da mão de obra devem residir em maximizar o consumo de ração das matrizes. Ter familiaridade com alguns dos principais fatores que afetam o consume na lactação é essencial para esse objetivo. A temperatura das instalações, condição corporal ao parto e sistemas de arraçoamento estão entre os mais importantes.
Sempre que possível, a temperatura da sala de parto deve ser mantida entre 18 e 22°C. Temperaturas elevadas impactam no consumo de ração para todas as fêmeas em lactação, mas as de primeiro parto são mais afetadas. porcas de primeira paridade são as mais sensíveis. Essa é a justificativa técnica para que se tivermos que priorizar um setor na granja para climatizar que seja a maternidade o primeiro e o foco de temperatura nesse ambiente é para dar conforto térmico para as matrizes pois os leitões têm o seu refúgio aquecido.
A gestão rotineira do escore corporal seja de maneira visual ou com o uso de ferramentas como o caliper, avaliando e ajustando a oferta de alimento durante a gestação permite com que as fêmeas cheguem na maternidade com uma condição ideal de reservas corporais e com apetite para consumir ração na fase de lactação. Essa avaliação deve considerar os seguintes momentos: cobertura, 30, 60 e 90 dias de gestação, religiosamente. Infelizmente essa prática é bastante negligenciada talvez por sua simplicidade e falta de esclarecimento da sua relevância.
As necessidades de energia, aminoácidos e outros nutrientes das matrizes em lactação dependem principalmente da produção e composição do leite, peso e ordem de parto das mesmas. Obviamente, quanto maior a fêmea e quanto mais leite ela produz, mais energia e nutrientes ela necessitará. As fêmeas de ordem de parto um e, em menor grau, as de ordem de parto dois, ainda estão crescendo, então ainda estão depositando proteína. Mas a produção de leite tem prioridade sobre o crescimento.
Uma matriz jovem sacrifica o crescimento e até mobiliza reservas corporais de gordura e proteína para manter a produção de leite. Mas esse sacrifício vai até certo ponto. Após uma perda de 10-12% da massa protéica, a produção de leite diminui.
Existem algumas estratégias que podemos lançar mão para auxiliar no aumento do consumo da ração na fase de lactação:
1º) Se houver alimento disponível para elas, as porcas em lactação consumirão 20-25% de sua ingestão diária no final da tarde e durante a noite. Portanto, é particularmente importante ter alimento disponível para as porcas durante o período mais fresco do dia durante o tempo quente. Esse expediente é particularmente relevante na segunda semana de lactação.
2º) A frequência da oferta de ração deve ser aumentada o máximo possível. As fêmeas devem ser estimuladas várias vezes ao dia a se levantar, tomar água e comer a ração. Pode ser usado um balde plástico para cada fêmea com a quantidade de ração do dia e cada vez que se deparar com o comedouro vazio ofertar mais uma medida. No final do dia esse balde deve ser reabastecido para o dia seguinte.
3º) A apresentação da ração pode favorecer o consumo. Dar preferência na lactação para rações peletizadas ou trituradas ao invés das fareladas. A ração umidificada também favorece o consumo quando comparada com a ração seca. Ao molhar a ração atentar para que as sobras fermentadas sejam retiradas antes de reabastecer os comedouros com ração nova pois a fêmea pode não ingerir essa mistura.
4º) É fundamental dispor de água considerando qualidade e quantidade da mesma. Para qualidade devemos considerar a condição microbiológica livre de coliformes fecais e numa faixa de temperatura entre 12 e 18 ºC. Cloração ou acidificação da água podem auxiliar na diminuição da contaminação bacteriana da água. Ter a tubulação enterrada a uma certa profundidade sem a exposição solar ajuda na manutenção de uma temperatura mais próxima da adequada. Para quantidade devemos garantir que o bebedouro dispense 2 litros de água por minuto. Devemos lembrar que o consumo de água interfere diretamente no consumo da ração.
5°) É possível adotarmos alguns aditivos chamados fitogênicos para aumentar o consumo da ração e até a melhorarmos a sua digestão e absorção dos nutrientes. Esses fitogênicos, que são obtidos de determinados vegetais, quando combinados de maneira inteligente, possuem a capacidade de modificar o cheiro e o gosto da ração, funcionando de maneira semelhante aos temperos usados na culinária, sendo capazes de gerarem atividades anti-inflamatória, antioxidante, antibacteriana e secretória de enzimas e sucos digestivos. O resultado disso é uma maior produção de leite com menor catabolismo lactacional, mais leitões desmamados e leitegadas mais pesadas ao desmame.
Como pudemos perceber a fêmea em lactação é uma categoria dentro da suinocultura moderna que é absolutamente chave para o sucesso técnico e econômico dos sistemas de produção. Precisamos fazer com que esse animal hiperprolífico consiga ingerir de maneira adequada volumes de ração para que possa produzir leite em qualidade e quantidade com o mínimo de perda de reservas corporais para evitarmos impactos de desempenho no curto e médio prazo. Esse desafio é forte, mas existem estratégias que são comprovadamente capazes de auxiliar nessa missão se bem implementadas.
Por Augusto Heck, gerente técnico de suínos da Biomin
Fonte: Texto Assessoria
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