Publicado em: 23/09/2013 às 14:50hs
O estudo é pioneiro no Brasil e pode fazer o Estado ser o primeiro do País a produzir leite sem restrições para alérgicos.
Atualmente, uma grande parte da população mundial apresenta distúrbios fisiológicos em função da ingestão do leite bovino. Existe o problema da alergia, ocasionado pela reação imunológica do corpo à proteína do leite, e a intolerância, em função da lactose, quando o corpo não produz a enzima que quebra a lactose do leite. De acordo com o professor do Departamento de Zootecnia da UFRN, Adriano Rangel, a elevada frequência de casos de pessoas com alergia ao leite bovino foi identificada em vários países. Isso, somado aos poucos estudos encontrados com esta linha de pesquisa, foram os fatores que o incentivaram a adotar a temática como objeto de pesquisa. “Como trabalhamos com um laboratório de qualidade do leite, nós achamos por bem tentar atender essa demanda”, justificou.
O objetivo da pesquisa é encontrar rebanhos potiguares com o potencial de produzir leite que não cause alergia a quem consome o alimento. Através da coleta de DNA de 115 bovinos potiguares, de raças zebuínas (Gir e Guzerá), do rebanho da Emparn, o estudo investiga uma variante genética da proteína láctea que propicie a produção de leite, por estes animais, não nocivo à saúde humana.
Além de Adriano Rangel, a equipe responsável pela análise é formada por Lilian Zaros, também professora de zootecnia da UFRN e Guilherme Lima, pesquisador da Emparn. A pesquisa também conta com a colaboração do laboratório de qualidade do leite (Laboleite) da UFRN, vinculado à Escola Agrícola em Jundiaí (EAJ) e da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (ESALQ), da Universidade de São Paulo (USP). Tanto EAJ quanto a ESALQ colaboram cedendo os equipamentos de seu laboratório para as análises genéticas.
A pesquisa “O estudo do polimorfismo no gene da beta-caseína em rebanhos zebuínos leiteiros no estado do Rio Grande do Norte” também se tornou a tese da dissertação de mestrado da zootecnista Tábata Lima, orientada por Adriano Rangel.
Leite passa por análises em São Paulo
A alergia ao leite é ocasionada pela reação imunológica do corpo às proteínas lácteas, principalmente à proteína beta-caseína (A1). Alguns estudos identificaram bovinos das raças zebuínas com uma variante alélica A2 da beta-caseína, entretanto, pouquíssimas pesquisas vêm sendo desenvolvidas sobre isso e a seleção de raças que apresentam este alelo com alta frequência, desponta como uma alternativa viável para a produção de um leite não alergênico.
A beta-caseína faz parte do grupo de proteínas das caseínas, o qual representa cerca de 75% a 85% das proteínas lácteas. Na grande maioria das raças de bovinos, que produzem o leite que acarreta alergia ao ser humano, o gene da proteína beta-caseína contém os alelos A1A1. “Se há o alelo A1A1 significa dizer que aquele animal vai produzir o leite alergênico, se o animal tiver o alelo A2A2 não é alergênico”, explicou Adriano Rangel. E acrescentou: “No entanto, poucos trabalhos têm sido desenvolvidos, então nós resolvemos em parceria com a Emparn realizar essa pesquisa aqui no estado”.
Em julho e agosto deste ano foram coletadas 115 amostras de pelos e sangue de rebanhos bovinos da Emparn, das raças Gir e Guzerá, para avaliação, em laboratório, do DNA dos animais. O estudo busca encontrar o alelo A2A2 da beta-caseína destas duas raças zebuínas. Segunda-feira recente (16), a mestranda Tábata Lima viajou para São Paulo, onde realizará durante dois meses as analises genéticas na ESALQ-USP.
“Queremos identificar nos rebanhos em estudo os alelos A2A2. Os animais que apresentarem essa característica do A2 são selecionáveis para produzir leite não alergênico”, disse o professor, contando com o sucesso de experiências realizadas no exterior. “Já existem indústrias na Nova Zelândia, por exemplo, trabalhando com leite e derivados oriundos de animais livres do problema alergênico”, informou. A produção do leite sem restrições ao alérgico seria possível através da seleção dos bovinos que apresentarem o alelo A2A2. No caso, os animais com a variante genética seriam separados e todo o leite produzido por eles será livre do componente alergênico.
Novas perspectivas de mercado
Para Adriano Rangel, a pesquisa abre novas perspectivas no mercado para indústria láctea que poderá trabalhar com leite e seus derivados com qualidade para este público específico. “É a oportunidade de pessoas que tem o distúrbio causado pelo leite, ter acesso a um produto de alta qualidade”, argumentou. Havendo o resultado positivo, o intuito é fazer a coleta em rebanhos leiteiros comerciais do RN, que estejam produzindo leite para o mercado.
O professor pretende divulgar a pesquisa em publicações científicas internacionais para dar visibilidade à descoberta e incentivar a rede empresarial a investir neste ramo. “É um passo interessante, abre novas perspectivas de mercado”, afirmou. Atualmente, as pessoas que possuem alergia ao leite são terminantemente proibidas de ingerir o alimento, ou qualquer derivado dele. Dessa maneira, recorrem a produtos como produtos alternativos.
No Rio Grande do Norte a maioria dos rebanhos é composta por bovinos mestiços, porém, para Rangel, esta questão não é impedimento para criação deste novo mercado. Ele acredita que podem ser encontrados os alelos não alergênicos nestes rebanhos também. “Não existem estudos com mestiços, mas há a possibilidade de encontrarmos animais com estes mesmos quesitos”.
ALERGIA
Apesar de o leite ser considerado importante na dieta de muitas pessoas, há diversos problemas são relacionados ao alimento. O principal deles é a alergia às proteínas lácteas. A maioria das pessoas com alergia ao leite desenvolve os sintomas antes do primeiro mês de idade, frequentemente, durante a primeira semana de introdução de alimentos à base de leite de vaca e pode afetar vários órgãos. A alergia pode causar mais de um sintoma ou, ainda, sintomas em mais de um órgão. Aproximadamente, 50 a 70% dos indivíduos apresentam sintomas na pele, 50 a 60% sintomas gastrointestinais e 20 a 30% sintomas respiratórios.
Os sinais da alergia aparecem não só pela ingestão do leite, mas pelo contato ou cheiro do alimento. Na pele, pode ocorrer coceira, vermelhidão, bolhas no corpo e inchaço nos lábios, olhos e orelha; já nas vias respiratórias, pode aparecer tosse, falta de ar, inchaço na glote e até mesmo choque anafilático.
Fonte: Novo Jornal
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