Publicado em: 22/12/2020 às 15:15hs
A produção média diária daqueles 100 maiores produtores de leite que participaram do levantamento foi de 19.238 litros, somando no ano 702 milhões de litros. Considerando uma produção de 33,5 bilhões de litros em 2017 (Anuário Leite, 2018), a produção dos Top 100 representou apenas 2% da produção total do país. Dos Top 100, 68% das fazendas produziram leite em sistema de confinamento total, ou seja, em termos relativos eles produziram apenas 1,36% do leite do país. Se a produtividade média desses foi o dobro da média dos 100 produtores participantes do Top 100, teriam produzido 2,72% do leite. Estressando ainda mais esses números, se apenas metade dos produtores que produzem leite em confinamento total participaram do levantamento do Top 100, a produção de sistemas em confinamento seria entre 2,72 a 5,44% do volume de leite produzido no país.
Ou seja, é possível admitir que mais de 95% do volume de leite produzido ainda venha de sistemas onde pelo menos em uma época do ano (período chuvoso) as vacas em lactação são alimentadas em pasto, enquanto as outras categorias animais (vacas secas, bezerras após a desmama e novilhas) são alimentadas praticamente o ano todo em pasto.
Em 2017 o Brasil foi o terceiro produtor de leite bovino mundial, mas com uma eficiência muito baixa considerando o número de vacas ordenhadas (quase 17 milhões), a produtividade por vaca (1.963 litros por ano), o volume de produção vendido por fazenda (70,6 litros por dia) (Anuário Leite, 2018), o volume de leite por funcionário (?), a produtividade de leite por hectare (?) etc. Se os sistemas de produção de leite em pasto são a base da produção de leite do Brasil, se conclui que muito se tem a aprender, mas também aplicar o aprendido, transformando informação em conhecimento.
Quando se olha para fora, onde é possível buscar uma referência de sistemas eficientes de produção de leite em pasto? Na Nova Zelândia. Então vamos a alguns índices de produção e de produtividade comparando o Brasil com esse país.
Em 2017 o Brasil produziu 33,5 bilhões de litros de leite a partir da ordenha de 17 milhões de vacas, com produtividade anual por vaca de 1.963 litros (5,38 litros de leite/vaca/dia) (Anuário Leite, 2018), enquanto a Nova Zelândia, produziu 21,4 bilhões de litros ordenhando apenas 5,05 milhões de vacas, com produtividade anual por vaca de 4.237 litros (11,7 litros de leite/vaca/dia) (New Zeland Dairy Statistics, 2018).
O Brasil produziu 33,5 bilhões de litros de leite a partir de 1,3 milhão de produtores, enquanto a Nova Zelândia produziu 21,4 bilhões de litros a partir de 11.590 produtores. Ou seja, o volume diário de leite por produtor brasileiro foi de 70,6 litros com 13 vacas em lactação, enquanto na Nova Zelândia em média cada produtor produziu 5,058 litros/dia com 435 vacas em lactação.
A fazenda leiteira média na Nova Zelândia mede 151 ha de área útil com produtividade média de 11.803 litros de leite/ha/ano a partir de uma taxa de lotação média de 2,84 vacas/ha (2,84 UA/ha). Por enquanto é preciso esperar a publicação dos dados definitivos do último censo agropecuário do IBGE para conhecer esses índices atualizados (IBGE, 2018), mas, com base no diagnóstico da cadeia do leite do estado de Minas Gerais, que é a maior bacia leiteira do país, aqueles indicadores médios de 1 mil fazendas foram: área média de 56,59 ha de área útil explorada para a produção do leite, 8,1 litros de leite/vaca/dia, 1,3 UA/ha e 1.180 litros de leite/ha/ano (GOMES, 2006).
E poderíamos continuar comparando indicadores de qualidade do leite (teores de sólidos, CCS (contagem de células somáticas), CBT (contagem bacteriana total), temperatura etc.), porcentagem de vacas inseminadas, os programas de melhoramento genético, mas vamos ficando por aqui.
Além dessas diferenças, a Nova Zelândia se caracteriza por ser um país exportador de leite, já que produz 21,4 bilhões de litros com uma população de 4,79 milhões de habitantes, enquanto o Brasil produziu 33,5 bilhões de litros de leite com uma população de 210 milhões de habitantes. Assim, a Nova Zelândia pode exportar 95% do leite produzido.
Agora não se deve fazer uma comparação direta já que os sistemas brasileiro e neozelandês são muito diferentes, a começar pelos tipos climáticos, de solos, infraestrutura das fazendas, espécies forrageiras, as raças e cruzamentos dos animais, nível de instrução dos produtores e dos funcionários, a cultura geral, o mercado, a pesquisa, o ensino, como também os desafios.
Mas o que se pode aprender com os neozelandeses? Primeiro, por meio de inventário de recursos se chegar a um diagnóstico de qual ou quais são os sistemas de produção de leite mais competitivos para as diferentes realidades do Brasil. Eles vêm fazendo isso há mais de um século e concluindo que para eles o sistema de produção baseado em pasto é o mais competitivo. Lá, mais de 85% da matéria seca ingerida pelos rebanhos é proveniente da forragem colhida por meio de pastejo. Depois, principalmente, ter foco no lucro, ou seja, é empreender todos os esforços no trabalho e no capital investido na atividade para alcançar o lucro, ao mesmo tempo que se opera um sistema mais simples.
Agora o que é animador são os índices alcançados em sistemas intensivos de produção de leite em pasto no Brasil já validados por mais de duas décadas. Infelizmente ainda representam um pequeno número, por isso ainda não impactam significativamente para aumentar os índices médios do país.
Em sistemas intensivos não irrigados a taxa de lotação, a produtividade por vaca e a produtividade por hectare alcançados em média são 4,15 UA/ha, 15 litros de leite/vaca/dia e 10,5 mil litros de leite/vaca/dia, respectivamente, enquanto nos sistemas irrigados tem sido 12,75 UA/ha, 15 litros/vaca/dia e 38,5 mil litros de leite/ha/ano (Aguiar, 2015). Mas esses têm sido valores médios, ou seja, existem sistemas com indicadores muito maiores. E com esses índices esses produtores brasileiros são tão ou mais eficientes que os produtores neozelandeses.
Mas então quais são as bases de um sistema eficiente de produção de leite em pasto que vem sendo adotadas pelos produtores brasileiros altamente tecnificados?
Um sistema de produção de leite em pasto é aquele que explora pastagens com forrageiras adaptadas às condições de clima e solo da região onde está a fazenda; em pastagens que foram bem estabelecidas e que, portanto, têm um bom estande de plantas; que tenha uma infraestrutura adequada para o melhor manejo do pastejo (módulos de pastoreio, piquetes) como também para o conforto dos animais (sombreamento, corredores de acesso, água em quantidade e qualidade etc.); em pastagens livres de plantas infestantes, pragas e doenças; em solo corrigido e adubado para produzir forragem dentro da meta estabelecida; sendo pastejadas por animais eficientes em converter forragem consumida em leite (litros), mas principalmente em sólidos do leite (gordura e proteína), em lotes de animais homogêneos, ou seja, bem apartados quanto à categoria e sendo suplementados para de fato suplementar apenas as deficiências de nutrientes deixadas pela forragem (Aguiar, 2015).
E na base de todo esse conhecimento aplicado a um sistema de produção de leite em pasto deve estar o planejamento alimentar. Um planejamento de uma empresa, quer seja urbana ou rural, se dá em três níveis, a saber: estratégico ou de longo prazo; tático ou de médio prazo e operacional ou de curto prazo. Em sistemas em pasto, o planejamento estratégico se dá em um período de 12 meses, é o ano; o tático se dá em períodos de chuvas e de seca (no Brasil tropical) e em períodos de primavera:verão e outono:inverno (no Brasil subtropical); e o operacional se dá num período de menos de um mês, são decisões semanais, diárias.
Para a elaboração de um planejamento alimentar em sistema em pasto recomenda-se conhecer a produção de forragem da pastagem ao longo das estações do ano. A metodologia mais consistente é a que adota a técnica direta de medição da produção de forragem, a qual se baseia no corte e pesagem da massa de forragem. Com base nisso, após um ano de monitoramento criterioso é possível calcular a capacidade de suporte anual, estacional, mensal e por ciclo de pastoreio. Com base nesses resultados será possível elaborar o planejamento alimentar do rebanho naqueles três níveis.
E por fim o produtor de leite, sua equipe e o técnico que os orienta devem ter um programa de gestão com foco no lucro, o qual se baseia nas etapas de inventário de recursos; emissão de um diagnóstico da situação atual e da potencial com base no inventario; no estabelecimento de metas de curto, médio e longo prazo; com base nesse plano de metas elaborar um planejamento, treinar os integrantes da equipe para a etapa de execução do planejado; criar formulários de coletas de dados; definir como os controles serão feitos; ter orçamento anual e mensalmente avaliar o orçado e o realizado; e avaliar os resultados técnicos e econômicos para se saber se as metas estão sendo alcançadas e tomada de decisões.
Adilson de Paula Almeida Aguiar - Zootecnista, professor de Forragicultura e Nutrição Animal no curso de Agronomia e de Forragicultura e de Pastagens e Plantas Forrageiras no curso de Zootecnia das Faculdades Associadas de Uberaba (FAZU); Consultor Associado da CONSUPEC - Consultoria e Planejamento Pecuário Ltda; investidor nas atividades de pecuária de corte e de leite.
Fonte: Scot consultoria
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