Publicado em: 07/08/2020 às 09:00hs
Nós sul mato-grossenses, de nascimento ou de coração, falamos com boca cheia para quem quiser ouvir que a nossa carne é a melhor do Brasil, que não existe melhor churrasco que o nosso. Será que estamos sendo bairristas ou essa afirmação tem um fundo de verdade? Pois bem, parafraseando a máxima de que “contra dados não há argumentos”, aqui neste artigo queremos mostrar para vocês alguns números que envolvem a produção de carne do Mato Grosso do Sul.
O nosso Estado esteve em primeiro lugar em tamanho de rebanho por muitos anos, e hoje estamos em quarto lugar, perdendo para o Mato Grosso, Goiás e Minas Gerais, com um total de 19 milhões de cabeças, representando cerca de 10% dos abates do país. Mas quantidade não é necessariamente sinônimo de qualidade.
Um trabalho publicado recentemente pela Universidade de Wisconsin, nos Estados Unidos, analisou dados de cerca de 4 milhões de animais abatidos em diversos Estados brasileiros e constatou que os animais de Mato Grosso do Sul estão à frente no quesito qualidade, onde 93% dos animais apresentaram padrão de qualidade desejável, comparado com outros Estados que apresentaram números bem inferiores chegando a somente 30% de animais desejáveis (avaliação de carcaça feita dentro do programa de qualidade do frigorífico em questão).
Pois bem, Mato Grosso do Sul é um Estado tradicionalmente pecuário, não vamos entrar aqui na questão histórica, seria assunto para outro artigo, mas o fato é que um dos fatores que influenciou e influencia essa “melhor qualidade dos animais” aqui abatidos é o programa de incentivo à produção de novilho precoce do Governo do Estado.
O Programa Novilho Precoce – PROAPE MS, iniciou-se na década de 90 e foi considerado pioneiro no Brasil. A fórmula é simples e eficaz: incentivo fiscal (redução de até 67% do ICMS) para os produtores que conseguem produzir animais jovens e com bom acabamento de carcaça. De fato, de lá para cá, o programa contribuiu para a redução da idade de abate dos animais que passou da média de 48 para 36 meses, juntamente com outros fatores como a melhoria das pastagens, da genética, da nutrição, das técnicas reprodutivas, da sanidade e da gestão. Recentemente, no final de 2016, o programa foi reestruturado e novas regras foram criadas para adequá-lo à nova realidade produtiva. As novas regras envolvem não somente as características de qualidade do animal abatido, mas também do sistema de produção do qual ele se origina, passando pela identificação individual, adoção de boas práticas agropecuárias, além das questões ambientais e legais da propriedade, evoluindo o programa dentro do seu objetivo de modernizar a pecuária sul-mato-grossense.
O programa conta atualmente com 2.850 produtores cadastrados e abateu em 2019, um milhão e dezesseis mil animais precoces, o que representa 23% dos cerca de quatro milhões de animais enviados para o abate no MS naquele ano. Estes dados são bastante expressivos e animadores, mas pensando que o programa se iniciou em 1992, devemos sempre nos questionar se podemos melhorá-los. Será que estamos atingindo o nosso real potencial de produção de novilhos precoces?
Vamos às contas: fêmeas de descarte, e que não entram no programa de novilho precoce, (acima de 36 meses) foram 1,1 milhões em 2019, ou seja cerca de 25% dos abates. Machos acima de 36 meses, foram 604 mil animais (15% dos abates). Se pegarmos o total de animais enviados para o abate (4,122 milhões de animais) e subtrairmos as fêmeas de descarte, os machos acima de 36 meses, e os animais que já são abatidos precoces, teremos uma sobra de 1,403 milhões de animais com potencial a curto prazo de se encaixarem no programa PROAPE MS e desta forma teríamos cerca de 60% dos animais do Estado abatidos precocemente. Ainda restaria um caminho a percorrer em relação aos 15% de machos que ainda são abatidos acima dos 36 meses, mas de imediato há espaço para mais que dobrarmos a quantidade de animais precoces produzidos no Estado.
Apesar de adesão ao programa Precoce MS vir aumentando a cada ano, atualmente são apenas 10% dos produtores do Estado cadastrados. O que poderíamos fazer para aumentar esta adoção? No nosso ponto de vista, este é um programa ganha – ganha, onde o produtor se beneficia não somente pelo incentivo fornecido pelo governo, mas também pela redução no ciclo de produção e aumento do capital de giro na propriedade. A ideia aqui é começarmos uma discussão sobre o que precisa ser melhorado/ otimizado e ouvir a opinião dos leitores em relação ao programa. Está faltando divulgação do programa? O incentivo não é suficiente para arcar com os investimentos necessários para a adequação da propriedade ao programa? Falta fomento de mecanismos de assistência técnica para a produção do novilho precoce?
De fato, por tudo que foi exposto aqui, acreditamos que se não temos a melhor carne do Brasil, estamos quase lá, temos potencial para incrementar nossa produção e produtividade, e por que não pensarmos em um selo de origem para a nossa carne: “Novilho precoce produzido em Mato Grosso do Sul”, com muito orgulho sim !!!
Thaís Basso Amaral e Rodrigo Gomes são pesquisadores da Embrapa Gado de Corte
Fonte: Embrapa Gado de Corte
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