Bovinos de Corte

O boi que pula a porteira 1º Parte


Publicado em: 30/10/2012 às 19:25hs

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Acredito que todos já notaram que o preço da carne bovina aumentou consideravelmente nas gôndolas dos supermercados. Será que o pecuarista esta ficando rico? Será que as aquisições e fusões dos frigoríficos motivaram um cartel de preços? Acredito que não! Mas antes de tomar partido, vamos avaliar algumas variáveis.

Em 2001, o consumo interno anual de carne em nosso País chegava a 35 kg per capita. Neste período o Brasil ainda buscava a liderança nas exportações, vindo a conquistá-la três anos depois quando superou a Austrália. Posição mantida até os dias de hoje. Nosso rebanho ultrapassa os 200 milhões de cabeças, representando aproximadamente um quinto da carne comercializada internacionalmente.

Parece simples, pois os números impressionam quando imaginamos que a quantidade de cabeças de gado é superior ao de habitantes e que o boi gordo é abatido com aproximadamente 18 arrobas após 36 meses (1@ = 15kg). E como moramos aqui pensamos que isso nos garante carne de boa qualidade a vontade à mesa.

Não é bem assim! Com o crescimento da economia interna registrado nos últimos dez anos ouve uma expansão no consumo de alimentos, principalmente pelas classes C e D, que também passaram a adquirir produtos antes visíveis apenas nas residências das classes A e B. É fácil notar nas filas dos caixas de supermercados a quantidade e de produtos nos carrinhos de compras. Dentre esses produtos esta a carne bovina e parte dela de partes nobres do boi.

Esse incremento no consumo de carne bovina de primeira linha pode mais facilmente ser notado em datas festivas, como as festa de final de ano, onde as prateleiras refrigeradas ficam praticamente vazias.

Vale ressaltar ainda que a nossa carne é consumida em mais de 180 países e que esta demanda não pode ser ignorada. Independente das barreiras e sanções impostas por alguns países, ainda vendemos muito lá fora.

Nos últimos anos acompanhamos o “fechamento da porteira” pela Irlanda, EUA, Rússia, dentre outros. Todos países de grande importância para nossa economia. Mas como somos brasileiros e “brasileiro não desiste nunca”, buscamos alternativas e migramos para novos mercados que, em volume de compra, mantiveram nossa balança comercial positiva.

É uma estratégia de cada país defender sua hegemonia, sua economia. Não é interesse de ninguém “enforcar” o próprio povo em favor do povo vizinho. A imposição de barreiras é uma estratégia governamental que intensifica ou não, de acordo com sua necessidade. Porém, nos últimos dias, visto as notícias da falta de boi no mercado devido à redução dos rebanhos do Uruguai, Argentina, EUA, EU e problemas com febre aftosa no Paraguai, tais imposições começam a desaparecer.

Nos EUA, fala-se na facilitação da entrada de nosso boi. Trata-se de uma ótima notícia, uma vez que o rebanho americano caiu para cerca de 92 milhões de cabeças, número inferior ao de 1952.

Já a UE, em crise e com medo de desabastecimento mudou o discurso com o objetivo de retomar as importações do produto brasileiro e transferiu para o MAPA toda a gestão para autorizar quais fazendas podem exportar. Ficou mais fácil, mas das cerca de 10 mil fazendas autorizadas a exportar para o bloco hoje, apenas 2 mil estão habilitadas.

Assim, mais uma vez, o Brasil será o centro das atenções e teremos a oportunidade sacramentar nossa liderança no setor.

Como mencionei, a escassez de carne esta ligada à renovação do rebanho, ou seja, ao abate de matrizes. Com menos matrizes, teremos diminuição da recria e, conseqüentemente, a redução do número de cabeças para engorda e abate.

O que temos de concreto neste cenário é que o aumento da demanda interna e externa e a diminuição da oferta sem dúvida manterá o preço do produto final elevado nos próximos anos, pois, de acordo com especialistas do setor, precisaremos de algo em torno de três a quatro anos para equalizar a produção/consumo

Considerando o cenário acima, eis que surge o “oportunista”. E não diga que o abate de matrizes é uma questão única da renovação do rebanho. Como em todo o lugar, existem aqueles que se aproveitam do leve aumento do preço, no caso aqui da arroba para ganhar um pouco mais, oferecendo ao mercado um produto de baixa qualidade, abatendo matrizes. Não me entendam mal, mas não podemos dizer que esse oportunismo seja errado, pois se faltar carne no supermercado é o churrasco do final de semana que está jogo!

Se pagamos mais caro pela carne que consumimos e consumimos toda a produção, porque o frigorífico continua a ter problemas de caixa e o pecuarista quase não vê diferença na arroba do boi? Talvez Deus possa responder!

É verdade que temos uma das melhores carnes do mundo, mas com apelo diferenciado. Nossa carne é de qualidade, porém, mais magra e com menos gordura de marmoreio e de cobertura. Somado a isso temos o custo de produção como vantagem incontestável (produção a pasto, uso de grãos em períodos determinados, boi de capim) o que torna nosso boi relativamente “barato” diante dos concorrentes.

Então porque nosso produto é mal visto lá fora? Porque não conseguimos vender para mercados de melhor remuneração? Será que é por causa da variação cambial, falta de transparência ou, de gestão das propriedades?

Enfim, o discurso é sempre de que nossa carne é de origem dúbia, que não possui rastreabilidade; que existem resíduos contaminantes, que não há comprovação sanitária, aftosa, procedência, etc.

Já para o setor o discurso é otimista e as ações começam a ser percebidas.

Talvez esteja exagerando, mas escutei um dia; “o único mercado do mundo em que o comprador tem que agradar o vendedor é o do boi”. Isso revela que ainda hoje existe certa distancia entre frigorífico e pecuarista, mas também sei que nos últimos anos essa distância vem diminuindo. Bom mas isso será tema para a próxima edição. Avaliem e deixe seus comentários.

Lucas Martins, gerente de contas da área de alimentos e bebidas de uma das maiores certificadoras do mundo. Contato: 011 3514-5768

Fonte: TÜV Rheinland do Brasil

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