Publicado em: 23/05/2018 às 00:00hs
Décio Coutinho: coordenador do Grupo Técnico de Defesa Sanitária da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA)
Por: Assessoria de Comunicação CNA/SENAR
O Brasil será reconhecido pela Organização Mundial da Saúde Animal (OIE) como país livre de febre aftosa com vacinação nesta quinta (24), durante a 86ª Sessão Geral da Assembleia Mundial da OIE, em Paris.
O coordenador do Grupo Técnico de Defesa Sanitária da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Decio Coutinho, que está em Paris acompanhando a sessão da OIE, fala sobre a importância desse certificado, o papel do Sistema CNA na conquista do novo status sanitário e dá um panorama sobre a luta contra a aftosa e as consequências da doença para o mercado.
Qual a importância do Brasil ser declarado livre de aftosa na assembleia da OIE (Organização Mundial da Saúde Animal) em Paris?
Decio: É uma mudança muito importante. A Assembleia Geral Ordinária da OIE vai declarar livre de febre aftosa com vacinação o Amazonas, o Amapá, Roraima, os três estados que faltavam, além de parte do Pará. Com isso, o Brasil sai da relação de países com áreas livres de febre aftosa para país livre da doença com vacinação. No momento que temos o país todo na mesma condição sanitária, a força de certificação é muito maior, a segurança é muito maior. E é mais um passo para ampliar os mercados e a renda dos produtores.
Como foi a participação da CNA nesse processo de erradicação da aftosa?
Os pecuaristas, a CNA, o Senar, as Federações nos estados e os sindicatos nos municípios tiveram participação decisiva ao longo dos anos para chegar aonde chegamos. O Sistema CNA é o grande responsável por ter colocado o produtor dentro do Programa de Erradicação da Febre Aftosa. As Federações são as grandes responsáveis pela existência dos chamados Fundos Emergenciais de Febre Aftosa. Esses fundos privados estão prontos para serem usados no caso de quaisquer ocorrências. O Sistema CNA através dos fundos foi o grande responsável por auxiliar a montar essa estrutura dos órgãos de defesa que estão espalhados pelo país. E o Senar tem papel fundamental com presença constante na ponta, capacitando produtores e trabalhadores rurais em vacinação.
A aftosa é uma doença curável? E o gado depois de tratado pode ser comercializado?
Sim. Depois de curado, o gado pode ser comercializado normalmente. Logicamente, que isso vai acontecer depois do período de interdição e de tratamento. Mesmo se a doença não for tratada, ela vai sumir, mas pode deixar algumas sequelas, como feridas, principalmente nos cascos. Em contato com a terra, com água, vai inflamar, vai contaminar e o animal não consegue andar, comer, beber água e aí ele pode até morrer. É por isso que o tratamento é fundamental.
No caso de suspeita da doença, como o produtor deve proceder?
Ele deve notificar imediatamente o serviço de defesa do seu estado. Aliás, o Ministério da Agricultura lançou o PEC Saúde Animal, que pode ser baixado em qualquer smartphone. Essa é uma ferramenta ágil que o produtor e o veterinário possuem para realizar a notificação de todo o tipo de doença, não só a febre aftosa.
Quais as principais formas de transmissão da febre aftosa?
A disseminação do vírus da aftosa é muito parecida com o vírus da gripe. Ocorre pelo ar, água, pessoas e trânsito de animais. Por isso essa doença é considerada comercialmente tão importante, porque ela é muito fácil de disseminar e muito rápida.
Quais os impactos que a febre aftosa traz?
A febre aftosa é acima de tudo uma doença que gera impactos econômicos. Se existe um foco de aftosa estabelecido, uma área é interditada. E o produtor fica impedido de comercializar os animais que estão nessa área, sejam bovinos, suínos, caprinos, ovinos. Então é uma doença que, como a gente costuma dizer, aparece mais nos cadernos de economia do que nos cadernos de saúde.
Quando foi a última vez que o Brasil registrou foco da doença?
Em 2006, no Mato Grosso do Sul.
A vacina contra a febre aftosa não traz riscos?
Não. Você submete o animal a um vírus que não é infectante, é um vírus modificado. A vacina é utilizada para manter o nível de defesa do organismo de toda população bovina e a imunidade em uma mesma situação.
Qual deve ser a periodicidade da vacina para que ela tenha efetividade?
O rebanho recebe a vacina duas vezes por ano. Ou seja, a cada seis meses e em períodos iguais para todos os produtores. Temos que ter um único intervalo, que é de no máximo 30 dias, para todo mundo vacinar. Veja o que acontece com vacinações nas cidades, como a poliomielite. É muito mais fácil você fazer uma grande campanha e marcar um dia para a população urbana ir se vacinar. A maioria da população vai ser capaz de se deslocar nesse dia para tomar a vacina. Agora, no campo a situação é mais difícil. Não dá para os produtores vacinarem toda a população bovina em um único dia. Então você tem um intervalo de 30 dias para que todo mundo faça a vacina.
Os componentes da vacina podem prejudicar o animal?
A vacina que temos é a melhor produzida até agora. O produto é exportado para o mundo inteiro. Na vacina, é utilizado um veículo oleoso. Quando o músculo é ferido, vai gerar um caroço no local, e é até recomendado que exista essa reação, porque o organismo joga todo o sistema de reação para aquele local. É esse processo que no final vai gerar a imunidade. E caroço não é abscesso. O abscesso acontece quando ocorre uma inflamação por algum motivo.
Por que a CNA pediu, em julho de 2017, a retirada da vacina da substância saponina?
Porque a saponina é um irritante. Então, além do óleo já existente na composição, a saponina causava uma irritação maior ainda. Aí você tem um caroço muito grande, o que facilita o processo de infecção, o surgimento de um abscesso, uma reação alérgica.
Os custos com vacinação são altos para os produtores?
Toda a operação para vacinar tem um custo alto. A vacina custa em torno de R$ 1,20 a 1,30 por cabeça, é aplicada duas vezes por ano. Além de comprar o produto, o pecuarista tem que colocar na sua planilha outros custos: combustível que usou para ir a cidade adquirir a vacina, o tempo que ele ficou na cidade, o gelo e a conservação que ele tem que fazer, o tempo de vacinação, o retorno à cidade para comunicar a vacinação. Então existe um custo alto para vacinar. Por outro lado, foi criado um calendário de manejo para o produtor em que ele aproveita para aplicar vermífugo, carrapaticida e outras vacinas.
O próximo passo é o Brasil ser reconhecido como livre de aftosa sem vacinação. Como será feito esse processo?
O Plano Nacional de Erradicação da Febre Aftosa (PNEFA) dividiu o país em cinco blocos e propôs um cronograma para cada um retirar a vacina. Vai ser assim:
Bloco 1 (AC e RO)
- Maio de 2019 - última data para vacinação.
- Maio de 2021 – solicitação de reconhecimento internacional pela OIE.
Bloco 2 (AM, PA E RR) e Bloco 3 (todos os estados do NE, com exceção de SE e BA)
- Maio de 2020 – última data para vacinação.
- Maio de 2022 – solicitação de reconhecimento.
Bloco 4 (BA, SE, ES, RJ, MG, SP, GO, DF, e TO) e Bloco 5 (MS, MT, PA, RS e SC)
- Maio de 2021 – última data para vacinação.
- Maio de 2023 – solicitação de reconhecimento.
Atualmente, Santa Catarina é o único estado com reconhecimento de área livre sem vacinação.
Fonte: Assessoria de Comunicação CNA/SENAR
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