Gestão

O Valor da Produção Agrícola


Publicado em: 25/05/2011 às 09:53hs

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Qual é a situação atual do valor bruto da produção dos principais produtos agrícolas no Brasil? O indicador é importante para se avaliar a conjuntura e a dinâmica de produção e preços dos produtos agrícolas, tendo em vista a orientação de políticas públicas e estratégias privadas dos agentes do agronegócio. Neste artigo pretende-se responder a essa questão por meio da análise do documento de estimativas do valor bruto da produção elaborado pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento e divulgado em abril de 2011.

A estimativa para o valor bruto total da produção em 2011 é de R$ 195,9 bilhões, o que representa um incremento de 8,34% sobre o ano anterior. Trata-se de um resultado favorável para o setor e que já poderia ser esperado, tendo em vista a demanda interna e externa de alimentos, o que se reflete no desempenho dos vinte produtos analisados. No contexto internacional, observamos um crescimento expressivo das cotações de commodities agrícolas e não agrícolas desde o ano passado. Com isso, os preços pagos ao produtor brasileiro que opera com produtos de exportação acompanham esse movimento. O resultado líquido tem sido positivo mesmo com a valorização do Real no mesmo período, que reduz o valor recebido nesta moeda para o mesmo montante em Dólares.

No ambiente doméstico, a economia passa por um processo de redução no nível de atividade, tendo em vista o processo de elevação da taxa básica de juros e de aplicação de medidas macroprudenciais pelo Banco Central desde o final do ano passado. Assim, enquanto em 2010 o PIB cresceu 7,5%, estima-se para 2011 um nível por volta de 4%. A justificativa para esse aperto monetário foi a elevação da inflação, alimentada pelos preços internacionais das commodities, problemas climáticos no início do ano, pressões altistas em salários e crescimento no nível de emprego. Como a estimativa do valor bruto da produção considera preços recebidos pelo produtor em janeiro de 2011, a conjuntura capturada ainda não incorporava de forma plena os efeitos das medidas adotadas pela autoridade monetária.

Em termos de produto, os destaques de crescimento no valor bruto em relação ao ano anterior são o algodão (60,5%), uva (43,5%), café (32,0%), milho (25,1%), e soja (15,8%). Este grupo, formado por commodities internacionais com participação relevante do Brasil, exceto no caso da uva, revela o impacto da elevação das cotações externas e da obtenção de volumes de produção expressivos, resultando em desempenhos superiores à média da produção nacional. Assim, observa-se que os agentes envolvidos com essas culturas estão conseguindo capturar rendas decorrentes da conjuntura internacional favorável no período. A cultura de destaque neste grupo é a soja, que apresentou o maior valor bruto entre todos os produtos pesquisados, com R$ 54,4 bilhões.

Os produtos com os piores resultados, considerando-se a redução percentual no valor bruto, foram a cebola (-62,8%), batata inglesa (-24,7%), trigo (-23,3%), cana-de-açúcar (-11,0) e tomate (-8,9%). Este grupo apresenta relação estreita com a demanda interna, exceto no caso da cana-de-açúcar, principalmente pela exportação de açúcar. Esse produto provoca um impacto expressivo no valor bruto total, visto que responde por R$ 29,3 bilhões.  A situação dos produtores dos demais produtos foi prejudicada com os valores obtidos, o que representa um risco para a próxima safra, considerando os incentivos negativos ao plantio com níveis adequados de insumos tecnológicos. Esta perspectiva indica que esses produtores poderão oferecer uma contribuição limitada ao controle da inflação por meio do aumento da oferta. A situação é particularmente grave para o trigo, que atingiu um valor bruto de apenas R$ 2,0 bilhões, mas é relevante para as cadeias produtivas de pães e massas, com expressiva participação no consumo das famílias.

Os produtos em situação intermediária em variação no valor bruto são a mandioca (10,1%), feijão (9,9%), laranja (8,2%), arroz (6,0%) e banana (-4,7%). Neste grupo, os produtores de laranja obtiveram o maior valor bruto total (R$ 13,0 bilhões), resultante principalmente da exportação de suco, com a situação favorável já citada. Os demais produtos estão associados à demanda interna, com um desempenho que parece suficiente para a manutenção dos produtores na atividade e para incentivar o plantio na próxima safra. Nesse subgrupo estão alguns alimentos básicos para as famílias de baixa renda, justamente as mais afetadas pelo processo inflacionário. Assim, tornam-se relevantes para a oferta futura os resultados satisfatórios obtidos pelos produtores envolvidos com essas culturas. Por outro lado, cabe destacar os valores brutos totais relativamente baixos para o arroz (R$ 7,6 bilhões) e feijão (R$ 6,6 bilhões), o que indica uma atratividade inferior à dos produtos destinados à exportação.
A análise da distribuição regional do valor bruto é útil para se avaliar a evolução nas vocações dos Estados para os produtos e as potenciais contribuições que eles podem oferecer para a economia local. Em termos de valor bruto total, as regiões apresentam a seguinte ordem decrescente: Sudeste (R$ 54,2 bilhões), Centro-Oeste (R$ 53,9 bilhões), Sul (R$ 50,8 bilhões), Nordeste (R$ 19,8 bilhões) e Norte (R$ 7,9 bilhões). A primeira posição da Região Sudeste pode ser atribuída ao desempenho expressivo do café em Minas Gerais e à cana-de-açúcar em São Paulo, apesar da queda percentual no valor desse produto em relação ao ano anterior. A segunda colocação alcançada pelo Centro-Oeste, com um valor muito próximo ao do Sudeste, tem como principais responsáveis os Estados de  Mato Grosso (R$ 34,6 bilhões) e Goiás (R$ 13,4 bilhões), em razão da alta participação da soja e do algodão. Cabe destacar que essa posição da Região Centro-Oeste foi obtida com a maior variação percentual entre as regiões (42,2%), enquanto a Região Sudeste apresentou uma redução de 0,98%.

A Região Sul, posicionada em terceiro lugar em valor bruto total, apresentou um desempenho mediano, atingindo R$ 50,8 bilhões (crescimento de 6,7%). Os resultados percentuais dos principais Estados produtores na Região foram superiores, com o Paraná atingindo 8,8% e o Rio Grande do Sul com 8,7%. As culturas predominantes nesses Estados são a soja, milho e arroz. Apesar de ficar em quarto lugar com R$ 19,8 bilhões, a Região Nordeste apresentou um crescimento percentual de 9,9% em relação ao ano anterior, indicando uma conjuntura favorável do setor agrícola que acompanha a evolução recente das demais atividades econômicas.

A análise apresentada do valor bruto da produção agrícola revela as oportunidades e os desafios presentes no agronegócio brasileiro e global. Em linhas gerais, os produtos destinados à exportação atravessam um momento de preços elevados, superando as perdas com a sobrevalorização cambial. A competitividade brasileira ainda está presente, apesar dos conhecidos gargalos de infra-estrutura e logística. Com isso os agentes conseguiram aumentar de forma expressiva a captação de rendas em relação ao ano anterior. Um setor em franca recuperação é o do café, no qual se observa a combinação de preços internacionais atrativos e aumento da oferta de produtos de qualidade superior, que permitem a obtenção de margens mais elevadas.

Uma situação diversa ocorre com produtos direcionados ao mercado interno. Os ganhos obtidos estão em patamares inferiores aos dos produtos de exportação. Um grupo apresentou uma situação ainda satisfatória, como nos casos da mandioca, feijão e arroz. Outro grupo teve resultados fortemente negativos, como os obtidos pelo trigo, cebola e tomate. Esta análise sugere alguma atenção por parte dos agentes públicos no sentido de se identificar os problemas específicos de cada cadeia produtiva, tendo em vista a busca de soluções que possam oferecer incentivos para o aumento da oferta. O trigo é o produto que deveria receber maior prioridade nesse processo, visto que tem enorme participação no consumo das famílias e na composição dos índices de inflação. A queda nos valores brutos da produção de desta cultura e outras direcionadas ao mercado doméstico representa um desafio a ser enfrentado por agentes públicos e privados envolvidos com o agronegócio.

Antonio Carlos Lima Nogueira - Mestre em administração pela FEA-USP, presidente do ISDAS – Instituto de Sociedades em Desenvolvimento Auto Sustentável, e-mail: aclimano@gmail.com

Fonte: Antonio Carlos Lima Nogueira

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