Publicado em: 11/06/2024 às 09:13hs
A Medida Provisória nº 1.227/24, trouxe mudanças significativas nas regras de compensação de créditos de PIS/COFINS, representando um desafio substancial para a lucratividade do agronegócio brasileiro, com impactos mais severos sobre os exportadores. Esta alteração legislativa, visando equilibrar os efeitos da desoneração da folha de pagamento, impõe uma gestão financeira mais complexa para os contribuintes, dificultando o uso de créditos acumulados e exigindo ajustes operacionais.
A Medida Provisória alterou o art. 74 da Lei nº 9.430/96, proibindo, a partir de 4 de junho de 2024, utilização de créditos de PIS/Cofins para o pagamento de débitos de outros tributos federais, inclusive os previdenciários (compensação cruzada). Os créditos de PIS e Cofins só poderão ser utilizados para compensar débitos das próprias contribuições de PIS e Cofins.
O saldo credor do PIS e da Cofins não poderá ser ressarcido em dinheiro, resultando em impacto negativo no fluxo de caixa das empresas. Os créditos decorrentes de operações desoneradas por imunidade (exportação), suspensão, isenção e alíquota zero permanecem passíveis de ressarcimento em dinheiro.
Apesar da possibilidade de restituição em direito no caso das exportações, a limitação imposta pela MP na compensação de créditos acumulados de PIS/COFINS sugere um cenário onde as empresas terão menos flexibilidade para abater esses créditos dos tributos devidos. Esta restrição pode resultar em aumento da carga tributária líquida, especialmente para as empresas do agro, onde as margens de lucro são tradicionalmente estreitas.
O agronegócio brasileiro, fortemente orientado para o mercado externo, encontra um obstáculo adicional com a nova MP. A diminuição dos créditos compensáveis pode tornar os produtos brasileiros menos competitivos internacionalmente, uma vez que os custos tributários elevados serão refletidos nos preços finais.
Não se pode perder de vista que a efetiva desoneração das exportações só ocorre por meio da fruição completa dos créditos respectivos, evitando a exportação de tributos e assegurando a necessária neutralidade e competitividade aos produtos nacionais. A lógica de desoneração fiscal de tributos indiretos que incidem sobre as exportações foi inspirada em modelos em vigor em outros países, tendo sido autorizada pelo GATT/OMC.
Em um modelo ideal de desenvolvimento industrial e estímulo às exportações é necessário que sejam implementados mecanismos que viabilizem a restituição integral dos tributos que incidiram sobre os produtos exportados. No entanto, as mudanças trazidas pela Medida Provisória nº 1.227/24 caminham justamente em sentido contrário a essa lógica.
Com uma parcela maior dos recursos destinada ao pagamento de tributos e aumento nos custos operacionais, há menos capital disponível para investimentos em tecnologia, infraestrutura e expansão, crucial para a modernização e o aumento da competitividade do agronegócio brasileiro. Este cenário pode culminar em um estrangulamento financeiro, especialmente para as empresas de menor porte, comprometendo a eficiência e inovação no setor.
É importante destacar que as medidas de estímulo às exportações desencadeiam benefícios para toda a economia nacional, uma vez que estimulam o setor produtor, o que automaticamente repercute não apenas no aumento do volume produzido, mas na qualidade do que se produz, gerando empregos e aperfeiçoamento dos processos produtivos.
Ao fomentar as exportações também é assegurada a existência de divisas necessárias para que o Brasil, possa importar de outros países a tecnologia necessária para modernização e ampliação de seu parque industrial e tecnológico. Se o volume de exportações do país não for suficiente para o equilíbrio da balança comercial, não terá divisas para importar bens de capital e novas tecnologias, de modo que a modernização da indústria dependerá exclusivamente de investimentos ou empréstimos externos, reduzindo a sua capacidade de crescimento.
Além disso, a MP contradiz as discussões recentes sobre a Reforma Tributária, que busca acelerar o ressarcimento dos créditos e promover a não cumulatividade dos tributos. Ao impor restrições que limitam a devolução de créditos e a desoneração das exportações, a MP ignora uma premissa essencial: evitar a exportação de tributos, uma prática alinhada com os modelos internacionais de tributação no destino, vital para manter a competitividade dos produtos agrícolas brasileiros no exterior.
A principal diferença entre o modelo brasileiro e os modelos da União Europeia e de outros países que adotam o princípio do destino está relacionado com os mecanismos de devolução de créditos. No Brasil, os mecanismos existentes já não estavam alinhados com a perspectiva de máxima efetividade e ficaram ainda mais distantes das práticas internacionais com as restrições impostas pela MP nº 1.227/24.
A aplicação da MP nº 1.227/24 levanta importantes questões sobre o balanceamento entre necessidades fiscais e o estímulo à exportação e ao desenvolvimento do tecnológico e industrial do agronegócio. É fundamental que o governo reconsidere as implicações desta medida, buscando soluções que promovam um ambiente de crescimento econômico e competitividade internacional.
Essa discussão destaca a importância de uma política fiscal que respeite os princípios de neutralidade e efetividade, fundamentais para o desenvolvimento do país e para a sustentabilidade do agronegócio como motor da economia nacional.
Luís Felipe Aguiar de Andrade, Renata Andréa Joner Parry e Rodrigo Berti Franciscon são, respectivamente, sócio e associados do Veirano advogados
Fonte: Conteúdo Comunicação
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