Publicado em: 17/04/2025 às 13:30hs
Queda na Produção: Impactos da Seca e do El Niño
A produção de castanha-da-amazônia, também conhecida como castanha-do-brasil ou castanha-do-pará, enfrenta uma queda significativa na safra 2024/2025, com consequências diretas para a economia local. A diminuição da produção está associada a uma seca extrema, exacerbada pelo fenômeno climático El Niño. Especialistas preveem recuperação na safra seguinte, porém, alertam sobre a necessidade urgente de implementar medidas de adaptação para evitar novos prejuízos.
A região amazônica experimentou um dos períodos de seca mais intensos dos últimos 40 anos, com a seca agravada pelo El Niño, que se estendeu entre agosto de 2023 e maio de 2024. A combinação de baixa nebulosidade, radiação solar elevada e queimadas prolongadas aumentou as temperaturas e reduziu a umidade do solo, comprometendo a floração e a frutificação das castanheiras.
Carolina Volkmer de Castilho, pesquisadora da Embrapa Roraima, explica que o ciclo reprodutivo das castanheiras é longo e sensível às variações climáticas. A floração ocorre anualmente, durando de quatro a seis meses, geralmente no fim da estação seca e início da chuvosa, enquanto a maturação dos frutos leva de nove a treze meses.
Lucieta Guerreiro Martorano, da Embrapa Amazônia Oriental, lembra que a situação atual é semelhante à crise de 2017, quando o El Niño de 2015/2016 causou temperaturas 2°C acima da média e uma seca excepcionalmente severa, prejudicando a floração e a formação dos frutos, além de reduzir a atividade de polinizadores.
Apesar da atual redução na safra, pesquisadores da Embrapa preveem uma possível superprodução na safra 2025/2026, fenômeno já observado após a crise de 2017. Segundo Patrícia da Costa, pesquisadora da Embrapa Meio Ambiente, as castanheiras tendem a compensar a baixa produtividade com uma maior frutificação nos anos seguintes, principalmente devido ao fenômeno climático La Niña.
No entanto, essa oscilação pode gerar instabilidade nos preços do mercado. Costa cita o exemplo de 2017, quando a alta demanda e a escassez de castanha elevaram o preço da lata (20 litros) para R$ 180,00, mas no ano seguinte, a superprodução e a diminuição da demanda resultaram em uma queda acentuada nos preços, com a lata chegando a valer apenas R$ 25,00. Esse fenômeno, conhecido como "efeito ressaca", causou perdas financeiras significativas para os extrativistas.
Para enfrentar os desafios impostos pelas condições climáticas extremas, é necessário adotar medidas de manejo e renovação dos castanhais. As castanheiras mais velhas estão morrendo, enquanto as mais jovens demonstram maior resiliência frente aos eventos climáticos extremos.
Pesquisas realizadas pela Embrapa têm demonstrado que práticas como o corte de cipós podem aumentar a produção das castanheiras em até 30%, além de melhorar as condições fisiológicas das árvores. Lúcia Wadt, pesquisadora da Embrapa Rondônia, destaca que essa técnica foi validada por um estudo de dez anos, que comprovou seus benefícios tanto para a estrutura das árvores quanto para o aumento da produção.
Além disso, a técnica de produção de mudas em miniestufas tem se mostrado eficaz, permitindo que os produtores aproveitem melhor o potencial de suas áreas de plantio, contribuindo para a regeneração das florestas e para a formação de novos castanhais. Marcelino Carneiro-Guedes, da Embrapa Amapá, reforça a importância de sistemas agroflorestais, como o "Castanha na Roça", que combinam a agricultura com a produção florestal, favorecendo a regeneração natural da castanheira.
Com a previsão de aumento na produção para a safra seguinte, é fundamental garantir a qualidade da castanha, especialmente no que diz respeito ao armazenamento e à secagem das amêndoas. O manejo adequado dessas etapas é crucial para evitar a contaminação por aflatoxinas, substâncias produzidas por fungos que se desenvolvem em condições inadequadas de armazenamento e que podem ser prejudiciais à saúde.
Cleisa Brasil, pesquisadora da Embrapa Acre, enfatiza a importância das boas práticas de coleta, como a secagem rápida e uniforme das amêndoas e o armazenamento em locais secos e arejados, para garantir a qualidade e segurança alimentar do produto.
Diante da instabilidade provocada pelos eventos climáticos extremos, a criação de um seguro-extrativismo tem sido debatida como uma solução para proteger os extrativistas. Esse mecanismo garantiria compensações financeiras nos anos de baixa produção, oferecendo maior segurança econômica às comunidades extrativistas.
Napoleão Ferreira de Oliveira, da Associação Apavio, destaca que a falta de chuvas tem afetado não apenas a produção de castanha, mas também de outros produtos essenciais como o açaí. Ele sugere a criação de um abono para os extrativistas, similar aos auxílios concedidos a outros setores do agronegócio. Segundo Oliveira, sem essa segurança, muitas famílias extrativistas serão forçadas a abandonar a floresta, impactando negativamente a conservação da Amazônia.
A Rede Kamukaia, coordenada pela Embrapa, reúne pesquisadores, ONGs e universidades para desenvolver tecnologias sociais e entender os aspectos ecológicos e socioeconômicos das espécies vegetais usadas como produtos florestais não madeireiros. O projeto NewCast, com foco no fortalecimento da cadeia produtiva da castanha-da-amazônia, é um exemplo de como a pesquisa pode contribuir para melhorar a produção e a qualidade do produto, além de valorizar as comunidades extrativistas.
O projeto NewCast, iniciado em 2024, contará com a colaboração de várias unidades da Embrapa e comunidades parceiras nas Reservas Extrativistas do Rio Cajari (Amapá) e Baixo Rio Branco-Jauaperi (Roraima/Amazonas), bem como em Terras Indígenas, como a do Rio Branco (Rondônia) e WaiWái (Roraima). O projeto visa superar os desafios na produção e melhorar a qualidade da castanha, expandindo a base produtiva e valorizando o produto no mercado.
A escassez de castanhas pode afetar a renda das comunidades extrativistas que dependem desse produto. Em diversas regiões, como a Reserva Extrativista Cajari, no Amapá, a seca causou perdas significativas na produção. Paulo César Nunes, da Cooperativa do Povo Indígena Zoro (Cooperapiz), explica que a quebra na produção comprometeu contratos e impactou a renda das famílias extrativistas. A cooperativa, no entanto, recebeu apoio da Cooperação Internacional para facilitar a aquisição de castanha, embora Nunes defenda o fortalecimento das indústrias de base comunitária para garantir a sustentabilidade do setor.
Ítalo Tonetto, da Castanhas Ouro Verde, em Rondolândia (MT), destaca a necessidade de previsibilidade no mercado e comunicação transparente com os clientes, para lidar com os riscos da safra atual e assegurar a normalização na produção futura.
Fonte: Portal do Agronegócio
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