Biodiesel

Radar Agro: Sanção da Lei "Combustível do Futuro" Impulsiona o Setor de Biocombustíveis

Novas metas e programas visam aumentar a participação de biocombustíveis na matriz energética brasileira


Publicado em: 15/10/2024 às 16:00hs

Radar Agro: Sanção da Lei "Combustível do Futuro" Impulsiona o Setor de Biocombustíveis

Na última terça-feira, 8 de outubro, foi sancionada a Lei "Combustível do Futuro", um marco importante que reúne diversas iniciativas destinadas a ampliar a presença de biocombustíveis na matriz energética do Brasil. A nova legislação também incorpora inovações tecnológicas e promove políticas mais modernas voltadas para a descarbonização do país.

A lei altera os percentuais de mistura de biocombustíveis na gasolina e no diesel comercializados no Brasil. Além disso, estabelece a criação de programas para o desenvolvimento de combustíveis sustentáveis, como o Combustível Sustentável de Aviação (SAF), o diesel verde, o biometano e a captura e armazenamento de dióxido de carbono.

Um aspecto significativo da nova legislação é a introdução de modelos de metas para a redução das emissões de gases de efeito estufa (GEE) nos combustíveis, substituindo as metas volumétricas que atualmente regulam o teor de biocombustíveis misturados aos combustíveis fósseis. Essas novas políticas têm como objetivo tornar-se mais eficientes na redução da pegada de carbono dos combustíveis, incorporando análises do ciclo de vida dos produtos.

Em termos gerais, a lei estabelece a base para a implementação de programas existentes e amplia os limites já previstos. A responsabilidade pela implantação das metas será do Conselho Nacional de Políticas Energéticas (CNPE), enquanto a normatização e fiscalização ficarão a cargo da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) e outras agências reguladoras.

Embora a implementação das novas metas dependa do CNPE, a Consultoria Agro do Itaú BBA desenvolveu cenários para avaliar o potencial impacto dessas mudanças em diferentes mercados de combustíveis.

Gasolina e Etanol

O tradicional programa de biocombustíveis do Brasil receberá um novo impulso. O percentual de mistura de etanol anidro na gasolina poderá alcançar até 35%, mantendo um mínimo de 22%. A regra anterior permitia uma variação entre 18% e 27,5%, sendo que o teor atual está fixado em 27%.

Estudos de viabilidade técnica já foram realizados para aumentar a mistura de etanol anidro para 30%, enquanto a elevação do percentual para 35% exigirá novas análises.

A Consultoria elaborou um cenário para mensurar o impacto da nova legislação sobre o consumo de etanol, considerando um crescimento anual de 2,5% na utilização do Ciclo Otto no Brasil e um teor de anidro de 35%, mantendo o percentual do etanol hidratado em 24% durante o período. Assim, estima-se que, em 13 anos, o consumo de etanol anidro aumente em 9,5 bilhões de litros, sendo 4,9 bilhões de litros decorrentes do aumento do teor de mistura.

Diesel e Biodiesel

Para o biodiesel, o teor máximo de mistura será gradualmente elevado para 20% até 2030 e, a partir de 2031, poderá chegar até 25% do diesel. Contudo, o CNPE será responsável por definir as metas anuais com base em análises de viabilidade. Novos estudos são necessários para viabilizar o aumento da mistura acima de 20%.

A Consultoria também elaborou um cenário para avaliar o efeito da nova legislação sobre o consumo de biodiesel, prevendo um crescimento anual de 2,5% no uso de diesel e um aumento do teor de biodiesel para 25%. Nos próximos 13 anos, o consumo de biodiesel poderá crescer em 13,9 bilhões de litros, sendo 10,3 bilhões de litros atribuídos ao aumento do teor de mistura.

Para estimar o impacto do biodiesel na demanda de óleo de soja, a Consultoria manteve constante o percentual atual de 73% como matéria-prima do biocombustível. A demanda deve crescer de 5,9 milhões de toneladas em 2024 para 15 milhões de toneladas de óleo de soja em 2037, resultando em um aumento de cerca de 9 milhões de toneladas.

Querosene de Aviação e SAF

Com a implementação do Programa Nacional de Combustível Sustentável de Aviação (ProBioQAV), foi criado um arcabouço legal que regulamenta a comercialização do combustível sustentável de aviação, conhecido pela sigla em inglês SAF. A ANP e a ANAC ainda devem normatizar as regras e os métodos de cálculo da intensidade de carbono.

A meta de redução de emissões no setor começará com 1% em 2027 e deverá alcançar 10% em 2037, conforme cronograma estabelecido pela lei. O CNPE poderá revisar essas metas ao longo do tempo.

Como os requisitos de certificação e elegibilidade do programa brasileiro ainda não foram definidos, foram utilizados parâmetros da metodologia do esquema de compensação e redução de carbono para aviação civil (CORSIA) da Organização de Aviação Civil Internacional (OACI). Embora o CORSIA tenha calculado a pegada de carbono de diversas rotas tecnológicas e matérias-primas, a ANP deve definir a metodologia brasileira, podendo haver mudanças nos parâmetros de intensidade de carbono dos processos de fabricação do SAF.

Para construir o cenário e mensurar os possíveis impactos da nova legislação, foram selecionadas rotas de produção de SAF, como HEFA (processo de hidrogenação de óleos e gorduras vegetais) e AtJ (álcool para querosene de aviação), utilizando etanol de cana, óleo de soja e sebo como matérias-primas. As premissas consideram um mercado de 11 bilhões de litros de querosene de aviação em 2037, com uma eficiência de 90% nos processos de produção do SAF. Para atender a demanda, as quantidades de biocombustível variam conforme a matéria-prima utilizada.

Gás Natural e Biometano

A nova legislação também estabelece um arcabouço legal para o biocombustível no setor de gás natural, criando o Programa Nacional de Descarbonização do Produtor e Importador de Gás Natural e de Incentivo ao Biometano. O programa estabelece metas de redução de emissões através do uso do biometano, com início em 2026 e limite de 10%.

Diferente de outros sistemas de metas, o consumidor de gás natural não precisará comprar diretamente o biometano para misturar ao combustível fóssil, podendo adquirir créditos de carbono. Nesse sistema, o consumidor que utilizar mais biometano do que sua meta poderá vender o excedente, enquanto aqueles que consumirem menos poderão comprar créditos, semelhante ao sistema de cap-and-trade utilizado em mercados internacionais de carbono. No Brasil, esses créditos serão denominados Certificado de Garantia de Origem de Biometano (CGOB).

A Consultoria elaborou um cenário para mensurar os impactos da nova lei, utilizando projeções do relatório Plano Decenal de Expansão de Energia 2034 da Empresa de Pesquisa Energética (EPE). Para calcular os valores de intensidade de carbono do biometano obtidos de subprodutos da cana-de-açúcar, foi estabelecido um padrão de 8,5 gCO2e/MJ, comparado a 80,0 gCO2e/MJ do gás natural.

Assumindo uma redução de 10% para o mercado consumidor de 55 milhões de m³/dia em 2034, a demanda de biometano deverá ser de 6,2 milhões de m³/dia. Com base na premissa de que novos projetos de biometano geram aproximadamente 15 mil m³/dia por milhão de toneladas de cana moída por ano, seriam necessários projetos em usinas sucroalcooleiras equivalentes a aproximadamente 410 milhões de toneladas de cana moídas por ano para atender a essa demanda.

Diesel Verde

O Programa Nacional do Diesel Verde (PNDV) estabelece a identidade do diesel verde, similar ao Renewable Diesel dos Estados Unidos, que geralmente é produzido a partir do processo HEFA, mas também permite diversas rotas tecnológicas. Além disso, o CNPE poderá criar uma meta volumétrica de até 3% de mistura no diesel fóssil. É importante ressaltar que a porcentagem de diesel verde não está relacionada à meta de biodiesel.

Considerações Finais

Com a sanção da lei "Combustível do Futuro", o governo reafirma o compromisso do Brasil com os biocombustíveis e a redução das emissões de gases de efeito estufa. A criação de um mercado crescente para combustíveis tradicionais e novas tecnologias favorece a expansão dos negócios e a diminuição da pegada de carbono da economia brasileira, posicionando o país de forma mais sustentável no cenário ambiental.

Esse tema, que une sustentabilidade, investimentos e crescimento econômico, contou com amplo apoio no Congresso Nacional, refletindo os anseios da sociedade brasileira em torno de uma agenda que integra esses dois tópicos frequentemente antagônicos em outros debates.

De acordo com a Consultoria Agro do Itaú BBA, a nova legislação terá um impacto positivo significativo na economia brasileira, especialmente no agronegócio, que é o foco de nossa análise. Apesar dos efeitos imediatos da sinalização de uma maior demanda já influenciar alguns investimentos no curto prazo, os impactos da lei serão mais evidentes no longo prazo.

Fonte: Portal do Agronegócio

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