Publicado em: 23/09/2013 às 07:50hs
Há alguns anos, a professora universitária Heloisa Colins decidiu transformar seu hobby em oportunidade de negócios. Amante do campo e especialmente da produção de queijos artesanais, ela investiu em seu rebanho de cabras, aprendeu a produzir queijos e desde então comanda o Capril do Bosque, uma simpática propriedade rural na pequena Joanópolis, aos pés da serra da Mantiqueira, a 115 quilômetros de São Paulo. O que era um passatempo para receber os amigos, após muita pesquisa e planejamento, se tornou um dos principais atrativos gastrônomicos da região.
Atualmente, o Capril recebe turistas de todo o Estado de São Paulo e regiões vizinhas, interessados em conhecer a criação de cabras, além de experimentar a variedade de queijos artesanais produzidos na queijaria da propriedade – atualmente são mais de 10 tipos – e conhecerem o Menu do Bistrô instalado na fazenda, comandado pela chef Juliana Raposo, filha de Heloísa. “Os visitantes vêm, em sua maioria absoluta, atraídos pelos queijos. Uma grande parte é de pessoas que já gostam muito de queijo de cabra, mas há também pessoas que vêm conhecer e experimentar”, conta ela.
O sucesso do trabalho de mãe e filha tem crescido bastante nos últimos anos. A propaganda boca a boca é a principal responsável pela atração de turistas. Heloisa também mantém um blog onde anuncia novidades do cardápio e conta um pouco da história dos queijos, inclusive do queijo azul e do pirâmide Cendré, dois tipos produzido no Brasil apenas pelo Capril. Entre os pratos mais pedidos do bistrô estão a tábua de queijos e o cabrito assado com risoto de camembert. Alguns queijos do Capril já podem ser encontrados em um empório de São Paulo. Com a demanda crescente, Heloísa investiu na construção de uma queijaria industrial, de onde saem as variedades de queijos que são comercializados e usados nos pratos do bistrô. No futuro, ela também planeja produzir doce de leite no local, tudo com leite de cabra.
Setor em construção
De olho nesse crescimento do turismo rural em todo o país, o Instituto de Desenvolvimento do Turismo Rural (Idestur), em parceria com o Sebrae, há três anos desenvolve uma pesquisa batizada de “Panorama Empresaria do Turismo Rural”. O intuito é captar dados que possam ser úteis para produtores e também para ajudar na organização do setor, que por ser bastante novo, ainda opera na informalidade. “O seguimento turístico dentro do agro é pouco conhecido no Brasil, não temos muitas informações e dados sobre quem são e quantos são esses estabelecimentos”, conta Andreia Roque, presidente do Idestur.
A pesquisa foi feita com empresários, agências e operadoras de turismo durante um evento do setor realizado em São Paulo. No levantamento, os principais tipos de produtos ofertados pelas propriedades são o turismo de aventura, restaurante rural, pousadas rurais, agroturismo, cavalgadas e fazendas históricas. A maior parte dos empresários – 85% deles – utiliza a web para divulgar seus produtos por meio de sites e só 15% usam as redes sociais, como é o caso do Capril do Bosque e também da Fazenda Nova, em Mococa (SP).
A propriedade histórica, que está nas mãos da mesma família desde 1830, viu no turismo rural uma oportunidade de complementar os negócios. “Os baixos preços agrícolas nos levaram a buscar alternativas e o turismo se mostrou uma forma de agregar mais renda”, explica Marina Rossetti Barreto Ribeiro, que junto com a irmã Laura representa a sétima geração da família a tocar a fazenda.
Marina explica que a propriedade foi ganhando atrações aos poucos, conforme a demanda dos clientes. Primeiro foi montada uma escola de equitação, já que Marina é formada como instrutora no esporte. Da atividade surgiu a ideia de um acampamento de férias só para filhos de amigos, mas em pouco tempo a propriedade passou a receber crianças de várias regiões. “Dois anos após começarmos, recebemos a ligação de um pai, dizendo que o filho se recusava a ir para a Disney, pois queria vir à Mococa. O pai também quis vir e se hospedar, assim, conforme a demanda, fomos criando os serviços”, conta a empresária.
De lá para cá as opções de atividades na Fazenda Nova só cresceram e hoje incluem cavalgadas, restaurante, hospedagem, além de um museu com objetos de trabalho históricos usados nas lavouras e na cozinha, além de receber grupos para a observação de pássaros (foto). Segundo o estudo do Idestur, a variedade de atividades proporcionada pelo turismo rural gera benefícios práticos como a redução do êxodo rural, maior conscientização dos turistas e preservação do patrimônio histórico.
Desafios
O crescimento das atividades ligadas ao turismo rural no Brasil, porém, vem esbarrando em algumas dificuldades como a baixa qualificação e as dificuldades dos empresários em obter financiamentos. Mas o principal entrave ao maior desenvolvimento do segmento, segundo Andreia, tem sido a informalidade. Ela explica que um dos principais desafios é justamente levantar dados sobre a atividade e batalhar por uma legislação que dê suporte a esses empresários. A falta de regulamentação tem efeitos práticos no dia-a-dia desses empresários, como explica Marina.
Segundo a empresária, a parte mais simples é inventar um produto dentro da sua fazenda que seja de interesse geral, como a produção de queijo ou a ordenha das vacas. “O difícil é a legislação engessada, a falta de conhecimento de contadores, do poder público. É ilegal vender produtos da fazenda sem SIF, ou outras exigências”, diz. Ela explica que o produtor rural não pode emitir notas fiscais de serviço para, por exemplo, domar um cavalo, o que faz com que várias atividades dentro do complexo acabem ficando na informalidade.
Mas pode ser que dentro de pouco tempo o desejo dos empresários de formalizar o setor se torne mais próximo. Isso porque está em discussão no Congresso um projeto de lei para regulamentar as atividades de turismo rural no País, iniciativa do Idestur juntamente com outros órgãos ligados ao turismo rural. “Esse projeto, se aprovado, permitirá que o produtor rural use seu registro para atuar também no turismo rural. Isso vai ajudar a regulamentar o segmento e torná-lo mais forte”, avalia Andreia.
Para Heloisa, mais do que o apoio do poder público, é preciso também trabalhar para mudar a cabeça do empresário. No caso de Joanópolis, ela afirma que falta à população, o entendimento de que é pelo turismo que virá o desenvolvimento da cidade. Ela cita também os investimento em infraestrutura como fundamentais, já que a cidade possui vários atrativos naturais, como a montanha do Gigante Deitado e uma represa no Rio Jaguari. “Poderia haver a recuperação da rota turística até a montanha e a construção de um complexo aquático na represa, isso atrairia mais turistas”, pondera.
Tanto Marina quanto Heloisa participam do Conselho Municipal de Turismo (Comtur) de suas cidades, órgão que atua em conjunto com a prefeitura e as secreterias de cultura e turismo, a fim de fortalecer o turismo. “Nesses 30 anos, tivemos pouca ajuda efetiva do poder público, que ou ignora o setor ou cria desestímulos para o turismo rural”, desabafa Marina. Já Heloisa explica que a organização ainda é tímida na cidade, mas está iniciada. Ela é membro do conselho do Comtur, representando os restaurantes e bares. “Ainda temos um longo caminho a percorrer. Dá pra inovar e fazer acontecer com pouco. Mas precisamos de boas cabeças e iniciativa. Pessoas engajadas são a matéria prima dos bons resultados”.
Capril do Bosque – Joanópolis (SP)
Fazenda Nova – Mococa (SP)
Fonte: Sou Agro
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