Meio Ambiente

O banco verde - para guardar boa parte das riquezas do mundo

Belas imagens de sementes de todo o mundo chamam atenção para um projeto de preservação ambiental ambicioso baseado em parcerias internacionais, inclusive com o Brasil


Publicado em: 30/01/2013 às 16:10hs

O banco verde - para guardar boa parte das riquezas do mundo

Um banco para guardar boa parte das riquezas do mundo. No qual só se pode fazer depósitos, que são para a vida toda. Transferências, só de conhecimento e tecnologia, e, no lugar de cheques e cartões, sementes de plantas. Longe de ser uma invenção de economistas europeus para sair da crise, o Banco de Sementes do Milênio (MSB, na sigla em inglês) é um projeto sediado nos Jardins Botânicos Reais Kew, em Londres, que busca reunir e preservar as sementes de todas as plantas do mundo, com base numa rede de parcerias com projetos nacionais de conservação.

Desde 2000 dedicando-se a catalogar a flora mundial, o acervo do MSB constitui-se na maior e mais diversa coleção do tipo no mundo. É o que conta Michael Way, ecologista do Kew. “Hoje, conservamos cerca de 10% das mais de 300 mil espécies de plantas que produzem sementes e nossa meta é atingir, até 2020, um acervo com 25% das sementes mundiais preservadas”, conta.

No banco, é possível encontrar sementes dos mais variados tipos e tamanhos, exaladas aos milhões, como no caso das orquídeas, ou solitárias filhas únicas, como a afrodisíaca semente de Seychelles nut. A iniciativa se transformou em livro pelas mãos do artista Rob Kesseler, da Universidade das Artes de Londres, e do morfologista Wolfgang Stuppy, do MSB. Seeds: Time Capsules of Life, publicação de 2006 cujas fotos ilustram este post, ganhou há pouco uma nova edição, além de uma versão em espanhol – infelizmente, não há previsão de lançamento em português.

Os registros detalhados foram produzidos com um microscópio eletrônico de varredura e Kesseler deu uma ‘mãozinha’ à mãe natureza no resultado final, colorindo as imagens a partir da palheta de cores das folhas, flores e frutos das plantas. A ideia, segundo ele, é usar a beleza para atrair leitores, como as plantas que atraem insetos. Stuppy completa: “Nossa abordagem pouco convencional visa atingir em especial aqueles que não costumam ser tocados por essa questão, mostrar como esse patrimônio é importante.” A parceria entre os dois também gerou outros livros com registros únicos da natureza, como: The Bizarre and Incredible World of Plants e Fruit. Edible, Inedible, Incredible.

Um banco por natureza

Mas um banco não vive só de arte, tem que gerar dividendos de longo prazo: no caso do MSB, capital científico na forma, por exemplo, de conhecimentos sobre morfologia, ecologia e biologia molecular das sementes. Afinal, para preservar cada amostra, é preciso entender a melhor forma de armazenamento, a frequência com que pode ser utilizada em testes, as condições ideais para sua germinação, entre outros aspectos.

Então, nada de números, certo? Bem, por mais paradoxal que pareça, os próprios pesquisadores trabalham, desde o fim de 2012, na avaliação financeira desse conhecimento inestimável. Segundo Way, a iniciativa visa mostrar as vantagens da preservação e é similar à do estudo TEEB, que determina valores monetários para a perda do capital natural e compara-os aos custos reais de ações de preservação.

Por fim, resta destacar que o trabalho e as metas ambiciosas que marcam o MSB não seriam possíveis sem um ‘mercado internacional’: uma grande rede de parceiros espalhados pelo mundo. A iniciativa atua junto a instituições de todos os continentes na criação de novas coleções, realização de pesquisas e catalogação de espécies, que são espelhadas localmente e no MSB. “Para atingirmos nosso objetivo em 2020, é necessária uma ampla colaboração internacional, um esforço integrado e contínuo de estímulo a projetos de conservação por todo o mundo”, explica Way.

O Brasil, a Embrapa e a biopirataria

Do Brasil, o MSB conta com muitas espécies da caatinga e do cerrado, frutos da parceria do jardim botânico britânico com a Embrapa nas décadas de 1980 e 1990. Mas, desde o início dos anos 2000, com a polêmica medida provisória 2.186-16, que trata da biopirataria e estabeleceu restrições à transferência de material biológico do país, a interação ficou mais complicada. “A medida foi um divisor de águas para o estudo dos nossos recursos genéticos, pois criou um ambiente de insegurança jurídica que reduziu as atividades de pesquisa e intercâmbio voltados à preservação da biodiversidade”, avalia o agrônomo brasileiro Juliano Pádua, da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa).

Mesmo com as dificuldades, Pádua acredita que o entendimento da necessidade de preservar o patrimônio genético das nossas plantas – e de nossos animais – tem crescido no país. “De acordo com suas características, os bancos de germoplasma podem ser importantes para a pesquisa, em especial genéticas, além de servirem como repositórios de longo prazo para preservar a variabilidade gênica das espécies”, explica. “Segundo a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), o país possui 383 bancos, além da sétima maior coleção de sementes do mundo, a Coleção de Base da Embrapa (Colbase), com cerca de 120 mil amostras de quase 700 espécies, a única capaz de conservar esse tipo de material por longo prazo no país”, afirma.

A coleção brasileira, que tem como foco espécies ligadas à agricultura, reflete uma característica do setor no país: “Apesar de biodiverso, o Brasil é dependente de espécies exóticas na alimentação, por isso a Colbase tem mais sementes de plantas estrangeiras do que nativas”, pondera Pádua.

Em 2011, a Embrapa firmou nova parceria com o Kew para cooperação científica e tecnológica na geração de conhecimento, qualificação dos bancos da América Latina, conservação da biodiversidade e promoção da agricultura sustentável. A iniciativa deu origem a dois cursos destinados a pesquisadores brasileiros e de toda a região. A instituição britânica também mantém parcerias com outros centros brasileiros, como o Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa).

Cofre do fim do mundo

Outra iniciativa de preservação de sementes – que está mais para uma caixa-forte do que para um banco – é a Svalbard Global Seed Vault. Apelidada de o "cofre do fim do mundo", a proposta do projeto, lançado em 2008, é preservar a flora do planeta no caso de algum evento cataclísmico que coloque em risco a vida na Terra. Construída na remota ilha de Svalbard, na Noruega, a caixa-forte de sementes é fruto de uma parceria entre o governo norueguês e a Organização das Nações Unidas (ONU) e possui capacidade para armazenar cerca de 2,25 bilhões de sementes, quando completa. Confira algumas outras iniciativas de preservação de sementes pelo mundo.

Fonte: Painel Florestal

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