Publicado em: 16/03/2010 às 09:23hs
De acordo com o relatório do IPCC (Painel Intergovernamental das Mudanças Climáticas) de 2007, vencedor do Prêmio Nobel, as atividades humanas são as responsáveis principais pelo desencadeamento do aquecimento global verificado nas últimas décadas. Dentre as atividades humanas, o próprio IPCC destaca sete setores como os principais responsáveis e, também, os virtuais candidatos a apresentarem soluções para o problema: agricultura, florestas, resíduos, energia, indústria, transporte e construção civil.
O caso da construção civil é particularmente notável: o setor responde por 40% do consumo de energia, 30% do uso de matérias-primas, 20% da água e 10% de toda a superfície do planeta. O setor também responde por 40% das emissões globais, 30% dos resíduos sólidos gerados e 20% dos efluentes líquidos lançados nos corpos d’água. Sem dúvida, o impacto ambiental é enorme. Quando considerada a vida útil das construções, o impacto em cada país é de 25 a 40 % de toda a energia consumida, 30 a 40% de todo resíduo sólido gerado e 30 a 40% das emissões de GEE.
Os impactos sócio-econômicos da atividade não são menos significativo: responde por 111 milhões de empregos em todo o mundo, 75% deles nos países em desenvolvimento e 90% em empresas com menos de 10 empregados, contribui com 10 % do PIB mundial e tem investimentos mundiais da ordem de US$ 3 trilhões anuais.
Por ter essa alta relevância sócio-econômica e ser um grande agente de mudanças climáticas globais, o setor de construção civil tem ensejado estratégias e postulado programas voltados para garantir a sua sustentabilidade, buscando manter e melhorar sua performance sócio-econômica e diminuir os impactos ambientais. Um das mais significativas adaptações foi a adoção de sistemas de Análise de Ciclo de Vida – ACV, dos materiais utilizados na construção civil – uma forma de analisar os impactos ambientais da cadeia produtiva.
Através da ACV, é possível identificar todas as etapas envolvidas na produção, transporte, manufatura e colocação dos materiais em uma determinada construção. Com essa avaliação, cada uma das etapas tem mensurado o seu impacto ambiental – principalmente em termos de água e energia (carbono).
Nesse sentido, várias ações tem surgido em todo o mundo, voltadas para o desenvolvimento de uma Arquitetura Verde, ou Arquitetura Sustentável, que possa permitir a perenidade das cadeias produtivas da construção civil, em uma economia de restrição de carbono, que já desponta no horizonte institucional - global e nacional, no caso brasileiro.
Com referência isso, a Comissão Econômica das Nações Unidas para Europa (UNECE), através da sua seção de madeira (UNECE/Timber) junto a FAO (Organização das Nações Unidas para a Alimentação), elaborou uma série de recomendações para o setor da construção civil, incluindo: recomendar a adoção de mecanismos para considerar o carbono sequestrado em produtos florestais madeireiros como forma de combater as mudanças climáticas e promover ACV da madeira, de maneira que ela possa ser incorporada ao sistemas de avaliação de ações de Arquitetura Verde e design verde. A comissão também recomenda que os estudos de ACV da madeira sejam atualizados periodicamente, para demonstrar a evolução da eficiência energética do material e contribuir na diminuição dos impactos dos materiais de construção, especialmente no contexto de consumo de energia.
Dessa forma, fica estabelecido não somente a importância do estudo da cadeia produtiva da madeira empregada na construção civil, mas também a possibilidade de aumentar a eficiência energética dessa matéria-prima, com base nos estudos realizados para determinar o seu impacto ambiental, notadamente nas emissões de carbono.
Ao obter uma avaliação detalhada e criteriosa das emissões associadas a produção da madeira, é possível integrar esse dado aos demais obtidos com o estudo das cadeias de outros materiais, obtendo uma ACV da construção como um todo. Vale a pena lembrar que a rastreabilidade dos produtos florestais madeireiros ao longo da cadeia produtiva, gera ainda a possiblidade dela ser utilizada para diminuir a contribuição do setor de mudanças de uso da terra nas emissões totais dos países. Com a perspectiva do estabelecimento de mercados regionais de carbono em um futuro próximo, isso significa dizer que a madeira poderá contribuir para gerar créditos de carbono para os usuários, principalmente se utilizada para substituir materiais como plástico, ferro e cimento, que tem uma alto nível de emissões de GEE (Gases do Efeito Estufa) associados.
Esses estudos de emissão de carbono ao longo das cadeias produtivas tem ganhado corpo a cada dia, e já é possível obter uma certificação ISO para as matérias-primas empregadas na construção civil, incluindo a madeira. No Brasil, o uso de madeira na construção civil está muito aquém do desejado (nos EUA são 95% de residências de madeira, na Europa são 25%), gerando um desperdício enorme de uma matéria-prima tão nobre. O estudo das cadeias produtivas e a comprovação dos efeitos altamente positivos da substituição de materiais com altos níveis de emissão de GEE associadas pela madeira, podem gerar um impulso significativo na mudança de comportamento dos consumidores. Principalmente dos consumidores mais conscientes.
No caso específico do Programa Minha Casa Minha Vida, do governo federal, a substituição de casas tradicionais de cimento e ferro, por modernas construções de madeira, pode significar uma grande oportunidade para diminuir os impactos ambientais dos materiais empregados e gerar um ciclo altamente positivo de consumo e plantação de florestas industriais. A replicabilidade dos estudos de ACV da madeira na construção civil para outros setores pode ser muito significativa, e gerar um ambiente adequado para que esse material ganhe o espaço que merece na nossa sociedade.
Eder Zanetti, Pesquisador UFPR, UNFCCC CDM AR RO
Fonte: Painel Florestal
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