Gestão

Identificando e Engajando Stakeholders

À medida que avançamos pelo século 21, os desafios no mundo dos negócios tornam-se cada vez mais complexos e imprevisíveis


Publicado em: 27/06/2008 às 08:42hs

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A questão do engajamento de stakeholders (partes interessadas; partes envolvidas...), ultimamente tão discutida e nem sempre bem compreendida, e da importância de sua correta identificação em qualquer processo que se pretenda sério (abrangente e legítimo) de gestão de sustentabilidade, é objeto do presente artigo.   

 

O parágrafo abaixo, traduzido do volume 1 do manual “The Stakeholder Engagement Manual1, dá uma idéia do desafio proposto às empresas e empresários comprometidos com o crescimento e perpetuidade de seus negócios daqui para frente.

 

À medida que avançamos pelo século 21, os desafios no mundo dos negócios tornam-se cada vez mais complexos e imprevisíveis. Surgem novas oportunidades para os lideres. Como reagir a questões globais prementes - mudanças climáticas, direitos humanos, e AIDS, para citar apenas três – que não estavam na pauta dos negócios há uma ou duas décadas?2 As empresas progressistas têm cada vez maior consciência da inter-relação e complexidade das questões ambientais, sociais e econômicas e reconhecem que não podem agir sozinho na busca de soluções.3

 

Apenas a constatação da existência da publicação referida - um manual de engajamento de stakeholders - de iniciativa de entidade canadense dedicada ao estudo do tema4, dentre dezenas de outros trabalhos produzidos por estudiosos e organizações, serve para comprovar a importância do assunto nos dias atuais.

 

Vencer o desafio da busca de legitimidade em qualquer iniciativa de negócios nesses novos tempos de globalização e mudança de paradigmas não é mais uma opção estratégica. É um imperativo para a perenidade e sucesso das organizações no longo prazo.

 

Nesse desafio, o engajamento das chamadas “partes interessadas” (stakeholders) aparece hoje como uma das mais importantes ferramentas para o entendimento, por parte das empresas, do verdadeiro significado da sustentabilidade e da importância de sua incorporação à estratégia da empresa.    

 

Considerando as iniciativas de entidades empresariais na elaboração de propostas para o aprimoramento dos principais instrumentos do desenvolvimento sustentável, o presente artigo procura refletir acerca dos processos de identificação e engajamento de tais partes interessadas nessa discussão. Pretende, dessa maneira, contribuir para o avanço das discussões das diferentes propostas, em direção ao seu aprimoramento, legitimação e institucionalização.

 

Identificação dos Stakeholders

 

Para as empresas, “partes interessadas” são as comunidades, instituições, indivíduos, governos, clientes, acionistas e fornecedores, dentre outros, com os quais a empresa mantém relação e algum nível de interdependência, que impactam sua ação e que, por sua vez, são impactados por ela.  

Engajá-los significa conhecer suas expectativas, estabelecer um canal efetivo de diálogo e troca de informações, num processo de avaliação permanente capaz de prevenir e mesmo remediar eventuais conflitos, recolhendo insumos que possam aperfeiçoar seu processo de tomada de decisão, reduzindo custos e adicionando valor aos seus produtos e serviços.

Será preciso identificar no universo de atuação dessas empresas, ai entendido toda sua cadeia de valor, quais os principais atores que mantém relação com seu negócio, examinando de que maneira são impactados por ele e como podem impactá-lo. Nesse sentido será preciso também identificar e explorar a visão dos que estão na periferia, à margem do processo, representados por aqueles, aparentemente bem mais distantes, que também podem ser afetados pela empresa, ainda que não possuam relação direta com ela. São os atores incluídos na categoria de stakeholders periféricos5.

 



O conhecimento e diálogo com tais stakeholders periféricos poderá antecipar potencias problemas bem como identificar novas oportunidades e modelos de negócios, permitindo ampliar o escopo da empresa (expansão) e integrar conhecimentos diversos e não-confirmados (inclusão). Isso significa fazer um esforço consciente para reverter as regras de destaque das partes interessadas, identificando atores que tenham sido completamente invisíveis no passado.6

Nesse particular é preciso se precaver contra nossos costumeiros preconceitos a influenciar no desenho de cada cadeia e, sobretudo, na identificação dos atores envolvidos por ela, a serem devidamente engajados em nosso esforço de pensar (intenção) e realizar (fazer) de maneira sustentável.

 

Aqui vale ressaltar os chamados “riscos mercadológicos” inerentes ao não engajamento ou não atendimento aos interesses legítimos de determinados stakeholders. Os excluídos poderão sempre, e é natural que o façam, fazer suas vozes ouvidas em outros fóruns e, no mínimo, dar oportunidade a que pessoas, grupos, entidades, instituições e até mesmo países criem dificuldades ao livre comércio, transformando suas demandas em barreiras comerciais.

 

Dependerá desse primeiro passo de criteriosa identificação das “partes interessadas” presentes ao longo de toda a cadeia produtiva o sucesso da fase seguinte de efetivo engajamento, num processo transparente e gradativo de construção conjunta. 

 

O aprimoramento dos inúmeros instrumentos do desenvolvimento sustentável, adequando-os aos atributos do tripé da sustentabilidade, não é mais tarefa ou interesse de um grupo apenas, senão obrigação de toda uma sociedade que clama por mais justiça social, equidade e preservação de nossos recursos naturais e culturais.

 

Engajamento

 

Ao examinar-se o verdadeiro sentido de “engajamento”, em seus componentes éticos e políticos, duas visões extremas e antagônicas emergem, indicando o quanto de ética e política está embutido em qualquer escolha metodológica que se faça na implementação de um processo de engajamento .

 

Processos de engajamento podem ser vistos, conforme nos lembra a especialista Maristela Bernardo7, de um lado, como meio de se promover o alinhamento de stakeholders aos interesses da organização, com um sentido de convencimento e aliciamento.

 

No outro extremo, pode-se ver o engajamento como parte de um processo de mudança estrutural de paradigmas, cuja compreensão requer levar-se em conta uma série de fatores, valores e transcendências.

 

“A abertura do diálogo das empresas com seus stakeholders possivelmente está, na média, em um ponto qualquer entre esses dois extremos, talvez bem mais próximo do primeiro”, nos lembra a especialista. 

É importante ressaltar que se trata, antes de tudo, da disposição de influenciar e ser influenciado pelo “outro”, levado efetivamente em consideração. Não no sentido de cooptá-lo, convidando-o a “aderir” a nossa proposta, mas, juntos, construir uma nova proposta que reflita, tanto quanto possível, o conjunto de crenças e valores de cada uma das partes, na direção do atendimento das mutuas expectativas.

No caso das iniciativas em curso, guardadas as características peculiares do setor ou cadeia produtiva a que se refira, há que se levar em consideração esses dois extremos na identificação e implementação da melhor metodologia de engajamento das partes interessadas que impactam e são impactadas pelas mudanças propostas.  

 

Só assim se poderá criar um ambiente que permita a construção conjunta de instrumentos legítimos e respeitados, que possam contribuir efetivamente para o exercício de um novo modelo de desenvolvimento, que atenda nossas necessidades atuais sem comprometer a possibilidade de que também as gerações futuras possam atender as suas.

 

José Carlos Pedreira de Freitas, engenheiro agrônomo, é consultor em sustentabilidade e diretor da HECTA – Desenvolvimento Empresarial nos Agronegócios. O autor agradece as críticas e sugestões do Prof. Rubens Mazon na revisão do texto.
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1 - The Stakeholder Engagement – Volume 1: The Gide to Practitioners’ Perspective on Stakeholder Engagement – By Stakeholder Research Associates Canada , Inc – Jully 2005
2 - “As we progress into the 21st century, challenges to business become ever more complex and unpredictable. Business leaders face new opportunities. How should business respond to pressing global issues - climate change, human rights and HIV / AIDS to name but three - that were not on the business agenda 10 to 20 years ago?
3 - “Progressive business are increasingly aware of the interconnections and complexity of environmental, social and economic issues and recognise they cannot act alone to find solutions”
4 - Stakeholder Research Associates, Canada
5 - Para um maior aprofundamento recomenda-se consultar o capítulo 7, “Ampliando a faixa de freqüência corporativa”, do livro de Stuart Hart, O Capitalismo na Encruzilhada, Bookman, 2006.
6 - Hart, Stuart L., Capitalismo na Encruzilhada – Porto Alegre: Bookman, 2006. 232 p.; 23 cm.
7 - Engajamento de stakeholders: que bicho é esse? Revista Adiante, Número 6, Junho, 2006

Fonte: José Carlos Pedreira de Freitas

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