Foram dezenas de propriedades visitadas onde pudemos ver a soja e o milho, tivemos longas conversas e troca de experiências com os produtores, além de confirmar o que o USDA tem relatado: esses estados estão com lavouras muito ruins.

No estado do Kansas, no município de Atchison, tivemos a oportunidade de acompanhar a colheita de uma lavoura de milho. Daniel Stuart, um produtor 54 anos, nos recebeu junto com seus dois filhos. Daniel estava operando a colheitadeira e um dos filhos operava o trator com uma carreta que recebe o milho que depois é descarregado no caminhão operado por outro filho dele.

Daniel foi muito simpático, estávamos preocupados com a forma como seríamos recebidos, afinal não havíamos agendado a visita. Pelo GPS do carro marcamos estradas paralelas e então seguimos acompanhando a safra. Mas para nossa surpresa, assim que Daniel nos viu deu a volta na colheitadeira e nos recebeu, meio desconfiado mas cortês.

Ana Maria, que faz mestrado na Universidade de Illinois e está nos acompanhando, foi logo falando do nosso objetivo, do Projeto Soja Brasil e tão logo ela disse que representamos os produtores de soja do Brasil eles abriram um sorriso e nos estenderam a mão com um “seja bem-vindo”. A maior dificuldade é explicar que queremos filmar e entrevistar, afinal a maioria das pessoas tem receio de dar entrevistas.

Felizmente Daniel foi logo autorizando tudo e passou a nos contar um pouco de sua vida. Nos disse que planta 300 ha de soja e 300 ha de milho. Ele contou que espera colher 100 sacas de milho e 40 sacas de soja, e que na safra passada colheu 210 sacas de milho e 55 de soja. Este ano ele antecipou o plantio por isto já está colhendo, mas geralmente costuma colher no final de setembro.

O Pedro, um dos jornalistas e nosso cinegrafista, acompanhou a colheita com Daniel e pôde registrar pelo monitor que aquela lavoura estava produzindo 85 sacas de milho, ou seja, abaixo do que Daniel espera. Porém, Luiz Patroni,  jornalista também do Canal Rural, observou que apesar da quebra da safra notou que Daniel e seus filhos estavam com um semblante feliz.

Daniel virou para nós e disse com um sorriso no rosto: “Olha, se a safra americana fosse cheia, plantamos 92 milhões de acres de milho, o preço estaria muito baixo, sendo assim, mesmo eu colhendo a metade do que estava esperando vendi todo meu milho a 328 dólares, a tonelada, apesar de ter segurado apenas 110 sacas por hectare isto me dará um bom faturamento, não posso reclamar”.

Perguntamos há quanto tempo ele estava produzindo naquelas terras e Daniel nos disse que seus filhos já são a sexta geração de produtores. Ele contou que saiu do colegial veio para a lavoura e amava produzir, e está muito feliz por seus filhos seguirem o mesmo caminho que ele. Perguntamos aos filhos dele se muitos jovens ficavam na atividade de seus pais e eles disseram que naquela região 50% dos filhos ficam, e para que fiquem precisam desde pequenos serem incentivados pelos pais.

Assim como a família do Daniel tem a família do Bill, do Eric, do Jerry e de tantos outros que falamos e estão há mais de 150 anos cultivando aquelas terras, com suas calças remendadas, boné na cabeça e um brilho nos olhos quando falam da produção, do desafio do futuro. É muito interessante ver a família unida produzindo, a mãe tocando o trator, o pai na colheitadeira e o filho no caminhão.

É curioso vê-los falando da importância da Lei Agrícola Americana, do quanto eles lutaram para ter uma lei que lhes desse segurança e o quanto é importante continuar trabalhando no congresso para que o seguro se mantenha. É muito interessante ouvir as histórias de como eles entregam sua produção a poucos quilômetros, e é impressionante andar em estradas de fazendas asfaltadas. Isso nos motiva a acreditar que um dia teremos essa realidade no Brasil.

Uma das coisas que me chamou muita a atenção foi quando o pai do Jerry, um senhor de 70 anos de idade, da sede da sua fazenda apontou para uma casa da propriedade que fica à frente uns dois quilômetros e nos disse: “Eu nasci naquela casa, agora quem vive lá é meu filho, o Jerry”, que logo veio até nós. Eu perguntei a ele porque tinham construído uma outra sede, e ele disse: “Jerry se casou e precisava viver sua vida, sendo assim fiz uma nova sede para mim” disse.

A história de Jerry e seu pai é a mesma de milhares de produtores, mas também ouvimos as histórias de outros que estão entre os milhares que deixaram suas propriedades e foram para a cidade, pois desistiram da vida no campo e estão arrendando suas propriedades. Em algumas regiões vimos muitas propriedades abandonadas, nos EUA está ocorrendo também a concentração de propriedades.

Uma das coisas que observamos é que em regiões de solos mais férteis a maioria das propriedades é bem arrumada, com máquinas novas e poucas são as propriedades abandonadas. Nas regiões onde as áreas são mais arenosas a realidade é outra: de cada cinco sedes duas estão abandonadas e fica visível a dificuldade com que vivem os produtores. Este é um exemplo que muitos produtores devem observar no Brasil e não se aventurar em terras mais fracas.

Amanhã continuamos rumo ao norte de Nebraska e depois para o estado de Iowa, que é o maior produtor. Como nesta região as propriedades são maiores iremos focar nosso trabalho em questões trabalhistas e ambientais, colher um pouco a experiência destes produtores e, claro, continuar a ver a situação das lavouras, mas adianto: todos dizem pensar em aumentar a área de soja e isto impacta diretamente no produtor brasileiro. Vamos ficar atentos.

GLAUBER SILVEIRA é presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Soja (Aprosoja Brasil) e, juntamente demais componentes da expedição, percorre os estados americanos por meio do Projeto Soja Brasil, uma iniciativa da Aprosoja Brasil e do Canal Rural. Confira outros posts sobre a expedição: http://blogs.ruralbr.com.br/sojaporglaubersilveira/.