Publicado em: 28/08/2012 às 23:53hs
A sétima estimativa do IBGE para a safra nacional de grãos indica uma produção de 163,3 milhões de toneladas em 2012, que é 2,0% superior à obtida em 2011 (160,1 milhões de toneladas) e 1,6% maior do que a estimativa de junho. Trata-se de um novo recorde histórico de produção, divulgado em um momento de crise de oferta e alta de preços no mercado global de alimentos. Nesse contexto, é interessante se analisar o caso da soja, um dos principais produtos do agronegócio no Mundo e no Brasil. Este artigo tem o objetivo de apresentar a situação atual da produção brasileira de soja com base em dados do IBGE e as perspectivas do mercado global desse produto, conforme as previsões do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA).
Conforme o IBGE, a área total a ser colhida em 2012, de 49,4 milhões de hectares, apresenta acréscimo de 1,5% frente à área colhida em 2011 e redução de 0,1% frente a junho. A soja mostra um acréscimo de 3,7% na área colhida e uma redução de 12,2% na produção, quando os dados são comparados a 2011. As reavaliações feitas no mês de julho confirmam o efeito da seca na produção deste grão. Apesar do crescimento na área, o regime de chuvas inadequado afetou o rendimento médio, que decresceu 15,3%.
A Região Sul foi a mais afetada pela estiagem, com diminuição de 37,1% na estimativa de produção, resultante de reduções de 29,5% no Paraná, 48,4% no Rio Grande do Sul e 27,6% em Santa Catarina, quando comparadas com a produção da safra passada de 2011. A redução na produção nacional de soja se aproximou de 10 milhões de toneladas. Mato Grosso e Goiás aumentaram suas produções, frente à safra anterior, motivados principalmente pelos aumentos nas respectivas áreas cultivadas. Na Região Nordeste o Estado da Bahia, embora tenha aumentado a área de plantio (+68.445 ha) em relação à safra anterior, reduziu sua produção 1,9%, também influenciada pela seca. O resultado agregado no País para a estimativa de produção ficou em 65,7 milhões de toneladas, em uma área colhida de 24,9 milhões de hectares.
O USDA divulgou neste mês de agosto a quarta estimativa da safra de soja 2012-13 referente à produção, consumo, exportações e estoques no mercado mundial. Para a produção, o relatório apresenta uma redução de 11 milhões de toneladas na produção mundial em relação à estimativa anterior, divulgada em maio. Essa entidade espera uma produção de 260 milhões de toneladas, o que representa um aumento de 10,4% sobre a safra de 2011-12.
Para 2013, o órgão estima a menor produção de soja nos EUA desde a safra 2007/08, resultado da forte estiagem que tem se agravado no país. A produtividade média deve ser a pior dos últimos 17 anos, atingindo aproximadamente 2,4 t/ha. A produção foi revisada para 73,3 milhões de ton., volume 14 milhões de ton. menor do que o apresentado no primeiro levantamento, o que fez com que os EUA perdessem a posição de maior produtor mundial para o Brasil. A China deve reduzir sua produção em 6,7% sobre o ano anterior, atingindo 12,6 milhões de toneladas.
O destaque positivo é para a produção recorde do Brasil, prevista em 81 milhões de ton., volume 3 milhões de ton. acima do estimado em maio e 23,4% maior do que a estimativa para a safra 2011/12. Cabe destacar que a estimativa dessa entidade para a safra 2011-12 é de 65,5 milhões de ton., que é muito próxima daquela apresentada pelo IBGE. A expansão prevista para 2013 parece viável, desde que as condições climáticas sejam adequadas, visto que seria possível atingir cerca de 75 milhões de ton. com o mesmo esforço realizado na safra atual e um aumento adicional de 6 milhões de ton. por meio de investimentos adicionais.
A previsão do USDA para o consumo global de soja para 2013 é de 256,9 milhões de ton., o que indica aumento de 1,2% em relação à safra anterior. A China, o maior consumidor mundial apresenta perspectiva positiva, com a previsão de aumento de 5,3% em relação ao ano anterior, atingindo 74,5 milhões de toneladas. O principal fator negativo no resultado global é o consumo de 44,4 milhões de ton. esperado para os EUA, o menor desde 1996/97. Esse volume é 8,9% inferior ao estimado para o ano anterior. No Brasil, terceiro consumidor mundial, espera-se um aumento de 1,1% sobre o ano anterior.
Para a União Européia, 5º maior consumidor mundial, o USDA prevê um consumo de 12 milhões de t, menor volume apresentado para o bloco desde 1999/00, início da série histórica. A Argentina deve ter um consumo de 39,9 milhões de ton., sendo 5,4% superior ao estimado no período anterior. Em resumo, pode-se considerar que a demanda deverá ser sustentada pela China e outros países emergentes, enquanto os países desenvolvidos tendem a prosseguir em uma situação de estagnação econômica, refletida na redução no consumo do produto.
Com relação às exportações globais em 2013, a previsão do USDA aponta para um crescimento de 3,8% sobre o ano anterior, atingindo 94,0 milhões de toneladas. O Brasil aparece como o maior exportador mundial, após um crescimento de 3,4 milhões de t no volume estimado pelo USDA em maio. O País deverá exportar 37,6 milhões de ton. em 2012-13, o que representa um aumento de 2,5% em relação ao ano anterior. Outro motivo que leva o Brasil ao 1º lugar no ranking mundial, é a retração do comércio de soja nos EUA. O USDA prevê uma exportação de 30,2 milhões de ton., menor volume desde 2005/06, que é 10,8 milhões de t inferior ao divulgado no levantamento de maio. Esse desempenho esperado indica uma redução de 17,8% em relação ao ano anterior.
Para a Argentina, na terceira posição em exportações, espera-se um volume 3,4 milhões de ton. acima da expectativa do 1º relatório, atingindo 13,5 milhões de ton. (73,1% superior ao ano anterior). Na quarta posição aparece o Paraguai, com uma exportação de 5,4 milhões de ton., indicando um crescimento de 74,2% sobre o ano anterior. O conjunto de previsões para as exportações revela uma expectativa de que a retração dos EUA provocaria um aumento da participação de Argentina e Paraguai, enquanto o Brasil não poderia explorar essa oportunidade de expansão das exportações em razão do elevado consumo interno de soja.
Com respeito aos estoques mundiais de soja em 2013, o USDA estima um crescimento de 2,8%, chegando a 53,4 milhões de toneladas. O crescimento no volume estocado no Mundo em relação à safra 2011/12 se deve principalmente ao aumento dos estoques no Brasil e na Argentina. Isso é resultado do recorde de produção nesses países. Dessa maneira o Brasil deve encerrar o ciclo 2012/13 com 16,2 milhões de ton. em estoques. Na Argentina esse volume é de quase 20 milhões de toneladas. Juntos, os dois países acrescentam 5,4 milhões de ton. ao estoque global, enquanto os EUA e a China apresentaram uma retração de 3,5 milhões de toneladas. A China deve apresentar uma redução de 18,4% em relação ao ano anterior, atingindo 11,8% milhões de toneladas, enquanto os EUA terá um decréscimo de 20,5% sobre o ano anterior. Nesses dois países, a redução dos estoques está associada à expressiva redução da produção. Ainda que o aumento dos estoques tenha um potencial efeito positivo para atenuar as oscilações de preços internacionais no futuro, no curto prazo o estoque representa uma redução na receita dos produtores de Argentina e Brasil, resultante da fraca demanda dos países desenvolvidos.
A análise conjugada das condições atuais de produção e das projeções para o próximo ano do USDA, revela uma forte influência de fatores climáticos adversos nas condições do mercado global de soja. Pode-se considerar que essa condição deverá estar presente com maior frequência no futuro em razão das mudanças climáticas globais previstas em diversos meios acadêmicos e no âmbito das organizações multilaterais. Ainda que essas condições possam se revelar com efeitos mais agudos, não podem ser consideradas totalmente inesperadas ou excepcionais, visto que sempre estiveram presentes nos mercados de commodities agrícolas. O que esses riscos climáticos devem provocar é uma mudança no comportamento dos operadores de mercados futuros e de derivativos de contratos de produtos agrícolas, no sentido de aumentar a aversão ao risco e de promover movimentos mais conservadores desses agentes.
Com relação ao papel do Brasil neste mercado, aparentemente as perspectivas ainda são positivas, tendo em vista as condições de preço para o próximo ano. A ainda que não se espere um crescimento expressivo da demanda nos próximos anos, dada a fragilidade das economias desenvolvidas, os países emergentes ainda representam um destino com razoável dinamismo para o consumo de soja. A estrutura produtiva de soja no Brasil continua sólida e com razoável saúde financeira, tendo sido beneficiada por uma consistência nas políticas agrícolas expressas nos planos de safra dos últimos anos. Outro vetor positivo para a safra atual e do próximo ano é a desvalorização cambial do Real em relação ao Dólar, que também favorece a receita dos exportadores, ainda que gere algum impacto nos insumos de produção.
Assim, a agenda para o agronegócio da soja, parece ser a continuidade dos esforços para ganhos de produtividade e gestão financeira, principalmente nas etapas de distribuição, logística e coordenação com os agentes da indústria processadora. Enquanto se aguarda a maturação dos investimentos em andamento na infraestrutura de transportes (rodovias, ferrovias e portos), os agentes privados podem aprimorar os mecanismos de financiamento com títulos privados e explorar com mais intensidade as ferramentas de redução de riscos em mercados futuros. Outra frente a ser atacada é a criação de novas cadeias produtivas de maior valor agregado, seja nas áreas de produção animal ou de produtos à base de soja com atributos específicos, obtidos por meio de inovações na área de genética ou engenharia de alimentos. Cabem também os estudos sobre os potenciais impactos das mudanças climáticas na geografia da produção de soja no Brasil, a fim de orientar as decisões de políticas públicas e estratégias privadas na expansão ou deslocamento das áreas de produção. Felizmente, o Brasil dispõe de tecnologia e recursos humanos capacitados para enfrentar esses desafios e continuar avançando nessa trajetória de sucesso do agronegócio da soja.
Antonio Carlos Lima Nogueira - Doutor pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e mestre pela USP em administração, professor na Faculdade de Tecnologia de São Paulo, e-mail: aclimano@gmail.com
Fonte: Boletim Informações FIPE
◄ Leia outros artigos