Publicado em: 28/02/2013 às 12:40hs
Na contramão desse movimento, produtores e empresários de Mato Grosso promoveram a abertura de áreas para que os interessados em iniciar atividades rurais no estado pudessem se instalar de maneira organizada. Com base nesse planejamento habitacional, Nova Mutum foi concebida em 1977, às margens da BR-163, rodovia federal que liga as regiões Sul, Centro-Oeste e Norte do país.
O processo de colonização atraiu principalmente produtores sulistas que não encontravam áreas disponíveis para expandir as plantações ou começar um negócio nos estados de origem. Natural de Ijuí (RS), Alcindo Uggeri, 74 anos, relembra que percorreu a região durante um mês, em 1975, até achar a propriedade que explora, com 12 mil hectares. Um dos primeiros moradores de Nova Mutum, manteve a agricultura como principal fonte de renda até 1990. Nessa época, a saca de milho chegou a custar apenas R$ 4,50. Hoje, o valor gira em torno de R$ 60.
Como alternativa para aumentar a receita gerada na fazenda, Uggeri resolveu investir também em suinocultura. Para viabilizar o negócio, foi criada uma cooperativa de produtores e um frigorífico. Atualmente, ele possui 564 matrizes confinadas para procriar e outros oito galpões nos quais faz a engorda dos filhotes para o abate. De acordo com Uggeri, a produção atende o mercado interno e uma parte é exportada para Rússia e países da Ásia.
Mesmo com a produção diversificada, o preço recorde da soja e do milho contribui substancialmente para a geração de riquezas em Nova Mutum. Em 2013, serão plantados no município 390 mil hectares de soja e outros 160 mil hectares de milho. Além de investir na suinocultura, o agricultor Neuro Antonio Coradini, 57 anos, explora 2 mil hectares com o cultivo de soja. Após a colheita da primeira safra, plantará 800 hectares de milho, 800 hectares de milheto e outros 400 hectares de sorgo.
Coradini lembra que, sem as duas plantadeiras, os três tratores e os dois pulverizadores, levava 125 dias para plantar um safra. Com a ajuda das máquinas, reduziu para 25 dias o tempo de plantação. "Também usamos três colheitadeiras no processo e essa modernidade nos ajuda bastante a prosperar nos negócios. A meta agora e aumentar ainda mais a produtividade que está em 57 sacos de soja por hectare", diz. Ele conta que toda a produção é vendida para a Cargill, Bunge e ADM.
Toda essa pujança atraiu para Mutum as principais concessionárias de máquinas agrícolas, como a John Deere, além de concessionárias de veículos como a Fiat. O comércio da cidade também começa a despontar. Pizzarias, padarias, bares e restaurantes estão em todas as esquinas. Com uma grande quantidade de terrenos vazios, o setor de construção civil também começa a se fortalecer. Pelo menos três prédios estão em construção, e casas são reformadas ou ampliadas pelos moradores.
A riqueza produzida pelo agronegócio desenvolveu Nova Mutum, mas alguns problemas persistem. Apesar de todas os domicílios possuírem água e luz, não há rede de esgoto na cidade; as casas e prédios possuem fossa séptica. O asfalto está em 85% das ruas e, segundo a prefeitura, até o fim do ano não serão mais encontradas pistas de terra. O que mais aflige os produtores da região, entretanto, é a situação da BR-163. A única rodovia federal que faz o escoamento dos grãos produzidos no município está em péssimas condições. Buracos são vistos em todas as partes, e o tráfego intenso de carros em alta velocidade assusta. A falta de acostamento amplia o risco de acidentes e atormenta motoristas que precisam parar o veículo por qualquer necessidade.
Oportunidades
O desenvolvimento da região atrai também trabalhadores em busca de melhores condições de vida. O casal Marilson Cardoso de Andrade, 32 anos, e Priscilia Neta da Silva, 33, chegou a Nova Mutum em 25 de dezembro de 2000, atraído pelas histórias contadas pelo irmão de Priscilia sobre a riqueza dos produtores locais e facilidades de emprego. Andrade era analfabeto e a mulher só havia cursado até a 7ª série. Mesmo assim, os dois conseguiram empregos em uma fazenda que começava a plantar uva no cerrado.
Ele fazia a limpeza do terreno e ela cozinhava para oito trabalhadores rurais. "Nunca tinha visto um pé de uva até chegar aqui", relembra Andrade. Ele aprendeu a ler, escrever e passou a controlar todo o trabalho no local. De trabalhador braçal, foi promovido ao posto de encarregado geral da fábrica de sucos Melina. Com o apoio do patrão, Priscilia concluiu o segundo grau. Deixou as panelas e chegou ao posto de auxiliar administrativa da empresa. "Agora quero fazer uma faculdade de recursos humanos a distância para me capacitar ainda mais", conta.
A história de superação do casal está ligada à trajetória da fazenda. Instalada em uma região de cerrado, com vastas planícies, em que há chuvas em abundância, a Agropecuária Melina é fruto de uma parceria bem-sucedida entre o capital privado e a tecnologia desenvolvida pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa). Por meio da correção do solo tradicionalmente pobre, e testes com 15 variedades de uvas, foi possível descobrir que duas delas, alteradas geneticamente, se adaptam bem às condições geográficas de Nova Mutum.
"Fazemos toda validação da tecnologia desenvolvida pela Embrapa e trabalhamos em parceria. Dessa forma, atingimos uma produtividade de 32 toneladas de uva por hectare, enquanto a média nacional é de 17 toneladas", explica o agrônomo e responsável técnico pelos 35 hectares de área plantada na Melina, Gervásio Marco Becker. O suco de uva engarrafado não recebe nenhum conservante e é fruto da mistura de duas variedades de uva. Mais um tipo do fruto está em fase de testes e deve ser usado nos próximos dois anos.
O maranhense Francisco Moura Filho, 25, também chegou à cidade para tentar a sorte. Deixou a esposa e três filhos em Pedreiras (MA), comprou uma passagem, colocou R$ 200 no bolso para custear as despesas iniciais e pôs o pé na estrada atendendo convite de amigos. "Enquanto eu sofro para ganhar R$ 500 por mês no Maranhão, os colegas tiram até R$ 2 mil aqui", se empolga. Apesar do ânimo, Francisco cursou até a 5ª série do ensino fundamental e só fez trabalhos braçais. Sem capacitação, está entre a massa de trabalhadores brasileiros que enfrenta dificuldades para conseguir uma ocupação. "Enquanto não consigo serviço, estou dividindo uma quarto de uma casa com cinco colegas. Pagamos R$ 150 de aluguel. Tenho disposição, mas não tenho estudo".
Fonte: Correio Braziliense
◄ Leia outras notícias