Milho e Sorgo

Técnica de processamento melhora a digestibilidade do sorgo e aumenta seu potencial antioxidante

Estudos comprovaram que o tratamento térmico de extrusão é capaz de aumentar a capacidade antioxidante dos grãos do sorgo e melhorar sua digestibilidade, ou seja, o aproveitamento dos nutrientes neles contidos


Publicado em: 07/08/2020 às 12:40hs

Técnica de processamento melhora a digestibilidade do sorgo e aumenta seu potencial antioxidante

As pesquisas foram desenvolvidas em parceria entre a Embrapa Milho e Sorgo (MG), Embrapa Agroindústria de Alimentos (RJ), Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e Universidade Federal de São João del-Rei (UFSJ).

Com esse resultado, o cereal, comumente utilizado na alimentação animal, se aproxima de outros já famosos na mesa dos brasileiros, como o milho e o trigo, inclusive no teor proteico, que superou 14%. O emprego da extrusão termoplástica promoveu ainda aumento nos teores de carboidratos e fibras e reduziu lipídios. Por isso, a ideia foi incorporar a farinha de sorgo em uma dieta enteral artesanal (dieta administrada via sonda) sem glúten. A dieta enteral é recomendada a pessoas que não podem ou não conseguem se alimentar totalmente pela boca e que não podem consumir glúten.

A presença de compostos com propriedades funcionais nos grãos de sorgo já é amplamente descrita na literatura. Eles estão associados a ações promotoras da saúde e podem ajudar a reduzir riscos de doenças crônicas não transmissíveis, como obesidade, diabetes e hipertensão arterial. São, principalmente, fibras alimentares, amido resistente e compostos fenólicos, como os ácidos fenólicos e os flavonoides (taninos, antocianinas, flavonas, flavanonas e outros).

As cultivares de sorgo com maiores teores de taninos são as que possuem maior concentração de fenólicos totais e, portanto, maior capacidade antioxidante, conferindo a esses alimentos potencial anti-inflamatório e anticarcinogênico.  “Entretanto, os taninos do sorgo são capazes de se ligarem a polissacarídeos e proteínas, formando complexos de baixa digestibilidade e reduzindo a absorção desses nutrientes. Por isso, é importante solucionar esse tipo de limitação para que os benefícios à saúde, atribuídos ao consumo do cereal rico em taninos, sobrepujem eventuais desvantagens”, destaca a pesquisadora da Embrapa Valéria Vieira Queiroz.

Os pesquisadores descobriram que o tratamento térmico por extrusão é capaz de melhorar a digestibilidade do sorgo. Trata-se de um procedimento tecnológico que modifica estruturas e conformações dos macronutrientes presentes no alimento. Esse processo permite um aumento de desempenho das enzimas digestivas e melhora os índices de digestão e absorção, tanto desses compostos quanto das proteínas e do amido presentes em quantidades relevantes na matriz alimentar.

O objetivo do estudo foi avaliar o efeito da extrusão termoplástica na composição nutricional, no conteúdo de compostos fenólicos e na capacidade antioxidante de grãos de dois genótipos de sorgo. Um deles é o SC 319, selecionado pela Embrapa Milho e Sorgo, entre 100 diferentes linhagens, com alto teor de taninos e alta capacidade antioxidante. E o BRS 332, um híbrido de sorgo sem taninos com baixa capacidade antioxidante.

O professor da UFMG Gilberto Simeone relata que também foram avaliados os perfis dos ácidos fenólicos, flavonoides, açúcares, aminoácidos e outros constituintes químicos desses grãos utilizando a técnica paper spray-mass spectrometry (PS-MS). “Na última etapa do trabalho, foi elaborada uma dieta enteral artesanal sem glúten, a partir do genótipo de sorgo mais adequado para esse fim. Avaliamos o efeito da extrusão e a digestibilidade in vitro para a incorporação do melhor sorgo em uma dieta enteral artesanal de qualidades nutricional, tecnológica e microbiológica adequadas”, diz o cientista.

Potencial para a nutrição enteral

Após avaliação da composição química e de parâmetros físicos como pH, fluidez, viscosidade e tamanho de partículas das farinhas de sorgo BRS 332 e SC319, foi selecionada aquela mais adequada, para desenvolver uma dieta enteral artesanal.

Os resultados mostraram que o uso da extrusão termoplástica produziu efeitos positivos nas características nutricionais e funcionais dos grãos. O processo elevou os teores de fibras, favorecendo a digestibilidade simulada in vitro, inclusive do genótipo contendo taninos (SC 319).

“Também elevou a liberação de compostos fenólicos totais, o que promoveu um aumento na capacidade antioxidante deles. Esses efeitos ampliam o potencial funcional dos grãos de sorgo, e aumentam ainda mais a possibilidade de uso do cereal na alimentação humana”, relata a autora da tese, Flávia Assunção Campelo.

“Além desses benefícios, alguns resultados permitiram concluir que a extrusão é capaz de melhorar a disponibilidade de compostos com características bioativas, uma vantagem em relação ao sorgo cru não tratado”, acrescenta Campelo. 

Digestão in vitro simula a atuação do sorgo no organismo

Queiroz ressalta que, após a digestão in vitro, as amostras exibiram perfis de peptídeos adequados à alimentação humana, com maiores proporções de peptídeos menores (< 89,08 Da), principalmente nas amostras extrusadas.

As amostras digeridas também apresentaram teores de compostos fenólicos e atividades antioxidantes superiores às amostras não digeridas. “O procedimento de digestão simulada in vitro é um ensaio importante para uma melhor compreensão da biodisponibilidade de componentes do sorgo dentro do organismo”, relata a cientista.

O professor Gilberto Simeone acrescenta que a dieta desenvolvida experimentalmente apresentou composição centesimal adequada às recomendações nutricionais para humanos adultos em terapia nutricional enteral. “Encontramos características que possibilitam que a dieta seja ministrada, via sonda, sem risco de entupimento e resultados microbiológicos dentro dos limites estabelecidos na legislação. Esses resultados confirmam que o sorgo extrusado tem potencial de uso também nas formulações enterais”, atesta o cientista.

Inovação técnica

Existem algumas técnicas de identificação dos compostos químicos presentes nos cereais, mas a maioria demanda muito tempo no preparo de amostras e realização da análise. Segundo a pesquisadora Maria Lúcia Simeone, uma inovação na técnica de espectrometria de massa com ionização em paper spray  pode ajudar a resolver esse problema.

"Essa nova técnica, realizada sob condições ambiente de ionização, preserva melhor as características da amostra e permite a aquisição de dados em uma ampla faixa de massa. Por isso, é ideal para avaliar o perfil químico de diversos compostos, como os ácidos fenólicos, flavonoides, açúcares, aminoácidos e outros em matrizes alimentares complexas, como os grãos de sorgo”, explica a cientista. Essas análises foram realizadas no Departamento de Química da UFMG em parceria com a UFSJ.

Segundo a pesquisadora, inicialmente, os grãos de sorgo dos genótipos SC 319 e BRS 332 foram cultivados na Embrapa Milho e Sorgo e processados na Embrapa Agroindústria de Alimentos para a obtenção das farinhas extrudadas e posterior determinação de suas composições químicas. 

Trabalho gerou artigo e tese

Parte dos resultados da pesquisa está publicada no artigo Study of Thermoplastic Extrusion and Its Impact on the Chemical and Nutritional Characteristics and Two Sorghum Genotypes SC 319 and BRS 33 (Estudo da extrusão termoplástica e seu impacto nas características químicas e nutricionais em dois genótipos de sorgo SC 319 e BRS 332). O trabalho compôs a tese de doutorado de Flávia Assunção Campelo, vinculada ao Programa de Pós-graduação em Ciência dos Alimentos (PPGCA) da Faculdade de Farmácia da UFMG.

A tese “Caracterização e análise de digestibilidade de farinha de sorgo para sua utilização em dietas enterais artesanais” foi fruto de pesquisa desenvolvida em parceria entre a UFMG, a UFSJ, a Embrapa Milho e Sorgo e a Embrapa Agroindústria de Alimentos.

O estudo contou com a orientação dos professores da UFMG Raquel Linhares Bello de Araújo e Inayara Lacerda (Departamento de Alimentos), e Gilberto Simeone (Departamento de Nutrição).  Houve participação, também, dos pesquisadores da Embrapa Valéria Vieira Queiroz, Maria Lúcia Simeone e Carlos Piler de Carvalho, além dos professores Rodinei Augusti e Ann Kristine Jansen (UFMG), Julio Melo (UFSJ) e do aluno de doutorado Mauro Silva (UFMG).

Fonte: Embrapa Milho e Sorgo

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