Publicado em: 24/02/2011 às 15:53hs
Situação Mundial
Com a inflação dos alimentos ocupando espaço na mídia mundial, análises apressadas passam a colocá-la como causa de vários acontecimentos recentes. Da mesma forma que o aquecimento global passou ser a explicação para todas as tragédias decorrentes de fatores climáticos, a recente alta dos preços dos alimentos está sendo colocada como causa de acontecimentos políticos no mundo árabe, como se os seus efeitos fossem sentidos apenas nesta região do planeta. Dentro desta linha de pensamento, a permanência de ditadores, que há décadas se mostram insensíveis às necessidades básicas da população, estaria garantida caso os preços dos alimentos não tivessem aumentado recentemente. Definitivamente isto não é correto e certamente outros fatores contribuíram para a situação atual na região.
Uma das lições rapidamente esquecidas da crise de 2008 foi a necessidade de cada país dedicar maior atenção ao aumento da produção de alimentos, com vistas a, no mínimo e na medida do possível, garantir a segurança alimentar de sua população. Quando os preços começaram a subir, naquela ocasião, alguns governantes dedicaram-se a criticar as possíveis causas da elevação dos preços, enquanto outros trataram de criar condição para o aumento da produção interna dos alimentos de primeira necessidade. Quanto mais pobre o país, maior a importância da manutenção de um estoque de segurança de grãos, adquiridos de preferência no mercado interno, e das ações que conduzam ao aumento da produtividade das lavouras (preços razoáveis de fertilizantes, mercado confiável de sementes melhoradas e atividades efetivas de transferência de novas tecnologias de produção). Críticas ao uso de grãos para produção de energia combustível (etanol ou biodiesel) ou relativas ao aumento das importações de alimentos pela China (fazer o quê, se este aumento é decorrente da elevação do nível de renda dos chineses?) não passam de elementos de retórica vazia.
É claro que parte do crescimento dos preços dos alimentos é decorrente de uma atividade especulativa nos mercados financeiros. Entretanto, frente à diminuição dos estoques de grãos no mundo inteiro, isto seria de se esperar, pois qualquer ocorrência climática nas principais regiões produtoras e com potencial exportador é potencializada nesta situação. Mas os fundamentos desta alta dos preços dos alimentos estão materializados no aumento na quantidade consumida, seja ela derivada da elevação da renda, seja derivada dos novos usos e na redução extemporânea da produção em países- chave para o abastecimento mundial.
No caso específico do milho, os preços na Bolsa de Chicago, após atingirem valores acima de US$ 7,00 por bushel, sofreram uma queda brusca para algo ao redor de US$ 6,60 por bushel (cerca de US$ 260,00 por tonelada). A relação de preços soja/milho caiu abaixo de dois, criando incentivos para que os produtores americanos invistam no plantio do cereal, em detrimento da soja. A situação política corrente nos países do Norte da África e do Oriente Médio levou o preço do barril de petróleo para acima do patamar dos US$ 100,00, o que pode fornecer combustível para novos incrementos no preço do milho ao fornecer suporte para o preço do etanol americano.
Na Argentina, algumas chuvas ocorreram; porém, em algumas regiões produtoras as perdas já haviam ocorrido, e existe uma expectativa de redução na produção em cerca de 10% em relação à produção obtida em 2009/10. Este acontecimento se constitui em motivo de alerta nos mercados mundiais devido à importância deste país como o segundo maior exportador mundial. Outro problema que está ocorrendo neste país é o sistema de retenções implantado pelo governo, com vistas a favorecer o mercado interno. A reclamação dos produtores é que este sistema deprime os preços internos e beneficia as empresas exportadoras, que exportam pelo preço do mercado externo.
Situação Interna
No Brasil, a colheita do milho tem prosseguimento no Sul do Brasil, com resultados favoráveis de produtividade, o que compensou parcialmente a redução na área plantada e o abastecimento do início do ano está garantido. Nas outras regiões o verão correu normalmente e a produtividade das lavouras premiou os agricultores que acreditaram no plantio do milho. Os períodos de deficiência hídrica, que foram motivo de notícias na mídia, ocorreram principalmente em regiões com menor importância para a produção de milho no Brasil, tais como o sul do Rio Grande do Sul e o leste de Minas Gerais.
O atraso no plantio da safrinha já está confirmado nas principais regiões produtoras de Mato Grosso. Segundo o Imea (Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária) a área plantada até 18 de fevereiro era 50% inferior à plantada no mesmo período de 2010. Este atraso potencializa a ocorrência de eventos climáticos desfavoráveis no fim do ciclo das lavouras de milho, ao mesmo tempo em que induz ao uso pelos agricultores de um pacote tecnológico menos intensivo na quantidade de fertilizantes e com uso de sementes de mais baixo custo. Entretanto, em função da alta instabilidade da safrinha, ainda é cedo para levantar previsões sobre o rendimento das lavouras.
Os preços do milho ainda não têm sido afetados por este início de colheita, sendo que em algumas regiões os valores continuam em alta. Esta conjuntura é decorrente da situação dos preços internacionais que continuam se elevando em relação ao verificado no ano anterior. Este quadro tende a se modificar na medida em que a nova safra vai chegando ao mercado. Porém isto irá depender do andamento da safrinha.
As exportações de milho pelo Brasil continuaram firmes no mês de janeiro (foram exportadas 1,023 milhão de toneladas), com os preços médios de exportação superiores a US$ 230,00 por tonelada. Estes preços estão próximos aos verificados no segundo semestre de 2008, o que reflete as condições favoráveis do mercado externo.
Nas próximas semanas as informações que afetarão o mercado mundial do milho começam a ser liberadas, com o início da safra no Hemisfério Norte. As primeiras projeções do USDA (Departamento de Agricultura dos Estados Unidos) sobre a área plantada serão liberadas no fim de fevereiro, e confirmadas nos próximos meses. No mercado interno, o acompanhamento da safrinha servirá para verificar a medida em que as condições climáticas, a quantidade e a qualidade dos insumos utilizados no seu plantio das lavouras desta época e o efeito da proteção com relação ao ataque de insetos-praga proporcionado pelas novas cultivares transgênicas (que já alcançaram 58% da área plantada na safra de verão) terão no resultado final a ser obtido pelos agricultores.
João Carlos Garcia e Jason de Oliveira Duarte - Pesquisadores da área de economia agrícola da Embrapa Milho e Sorgo
Fonte: Embrapa Milho e Sorgo
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