Cana de Açucar

Os impactos sociais e econômicos da mecanização da colheita da cana-de-açúcar

A colheita mecanizada só pode ocorrer em terrenos que possuem declividade máxima de 12%


Publicado em: 20/04/2009 às 11:11hs

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Foi aprovada em 11 de março de 2009 pela Câmara Normativa e Recursal do Conselho de Política Ambiental de Minas Gerais, a Deliberação Normativa que regulamenta o Protocolo Agroambiental de Minas Gerais.

O referido Protocolo, que foi firmado em agosto de 2008 entre usineiros e o Governo de Minas Gerais trata da proibição da queima da cana-de-açúcar e a instituição do corte mecanizado, a partir de 2014.

Destaca-se, no entanto, que os empreendimentos que se instalarem a partir de 2008 deverão mecanizar no mínimo, 80% da colheita da cana até 2009 e 100% até 2014. A lei ainda apresenta uma exceção referente ao aspecto técnico da captação da plantação. A colheita mecanizada só pode ocorrer em terrenos que possuem declividade máxima de 12%. Assim, as propriedades que possuírem declínio superior a este, o prazo para proibição das queimadas foi estendido até 2031.

Entretanto, a contenda que merece destaque é o embate entre o aspecto social e ambiental resultante da mecanização. Atualmente, apenas 30% das lavouras de cana-de-açúcar brasileiras são colhidas por máquinas. No Estado de Minas Gerais, na safra 2007/2008, 30,2% da colheita foi mecanizada e 69,8% manual. Já para a safra 2008/2009, a colheita mecanizada será feita em 37,6% da área plantada e 62,4% continuará sendo realizado de forma manual1.

A discussão ganhou destaque por força dos impactos ambientais causados pela queima da cana, que é imprescindível quando a colheita é feita na forma manual.

Nesse norte, é importante esclarecer que, a queima traz sérias conseqüências que passaram a preocupar os ambientalistas, tais como: agressão ao meio ambiente ocasionando desequilíbrios na flora e fauna; diminuição da qualidade do ar nas cidades e o aumento do efeito estufa, bem como a destruição da camada de ozônio; surgimento de chuvas ácidas, diminuindo assim a disponibilidade de nutrientes nos solos; entupimento dos poros da camada superficial do solo pelas cinzas, promovendo a formação de crosta superficial que reduz a infiltração da água e piora a sua aeração; favorecimento da infestação de microorganismos; maior dificuldade na purificação e conservação de caldos; destruição dos inimigos naturais de pragas da cana, da matéria orgânica e da micro e/ou macro fauna; além dos riscos de incêndios em áreas de preservação.

No que tange o aspecto econômico, as mudanças impostas pelo novo regramento exigem um considerável investimento inicial. Entretanto, a colheita mecanizada implica em uma maior eficiência, além de muito contribuir no aspecto ambiental, face a desnecessidade da queima das plantações.

A maior eficiência econômica se reproduz no significativo aumento da produção. Enquanto um trabalhador braçal consegue colher em torno de sete toneladas por dia, a máquina colhedora tem a possibilidade de alcançar mais de oitocentas toneladas.

No entanto, a mudança prevista pode gerar desastrosos impactos sociais. Uma máquina colhedora substitui cerca de 100 trabalhadores, e como conseqüência, de certo ocorrerá um aumento significativo do número de pessoas desempregadas no país, além de contribuir para a diminuição da qualidade social dessa mão-de-obra carente de postos de trabalhos na sociedade. Tais impactos tornam-se mais significativos nas localidades que tem na colheita da cana-de-açúcar a sua principal atividade de subsistência.

Importante ainda mencionar, que mesmo diante de inúmeros problemas sociais, que serão provavelmente desencadeados pela colheita mecânica, no aspecto econômico, esta mudança torna-se interessante. A soma dos custos com o corte, carregamento e transporte, é em média 25% (vinte e cinco por cento) menor que a colheita manual, quando o produto é colhido cru e mecanicamente. E ainda 37% (trinta e sete por cento) a menos, quando a cana é queimada e colhida mecanicamente2.

Outro fator preponderante para a preferência pela colheita mecanizada é a possibilidade de redução de custos com encargos trabalhistas. O Ministério do Trabalho e Emprego vem exigindo dos empregadores do setor sucroalcooleiro o registro formal de todos os trabalhadores, além do fim da remuneração por produtividade. Tais exigências oneram o custo da produção, acelerando o processo de adequação ao procedimento mecanizado de colheita.

Diante das ponderações apontadas, embatem-se Ambientalistas, Ministério Público e movimentos sociais. Os dois primeiros defendem a colheita mecanizada para preservação do meio ambiente, enquanto que os movimentos sociais, como o MST e outros, questionam, sobre o argumento de que, a mecanização da colheita contribui para desempregar uma grande massa de trabalhadores, além das conseqüências que a partir daí provavelmente surgirão.

Nesse cenário, inúmeros trabalhadores que viviam da colheita da cana-de-açúcar migrarão para os centros urbanos ou para as frentes de ocupação de terra. O problema toma dimensões ainda maiores diante do baixo nível de escolaridade destes trabalhadores: 71% dos empregados diretos na atividade lavoureira possuem até três anos de estudo e, dentro deste universo, 39% cursaram apenas um ano escolar3. Estes números demonstram a dimensão do problema ao deslocar estes trabalhadores para outros postos de trabalhos no meio rural ou urbano.

Assim, mesmo diante de inúmeros benefícios de ordem econômica face a mecanização da coleta da cana-de-açúcar, a Política Governamental Pública não pode deixar de observar os impactos sociais daí decorrentes. Trabalhos realizados pela Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiróz (ESALQ) mostram que a mecanização diminuiria em 273.276 o número de empregos ligados diretamente à produção da cana, o que representa uma diminuição de 53% no total da mão-de-obra utilizada na cultura da cana-de-açúcar4.

Dessa forma, é fundamental o desenvolvimento de outros setores mercadológicos, capazes de absorver essa mão-de-obra, que mesmo sem ter alta escolaridade, possui extrema eficácia técnica. Em conjunto, também é necessário intensificar o incentivo aos cursos de capacitação e requalificação dessa mão-de-obra, tanto por parte do Poder Público como da Iniciativa Privada.

Milena Silva Rocha Martins - Advogada do Escritório Brum & Advogados Associados
E-mail: brumadv@brumadv.com.br

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1 - http://www.canaoeste.com.br/

2 – http://www.zootecniabrasil.com.br/

3 – Ustulin, Edson José - CANA-DE-AÇÚCAR - Proteger o ambiente e continuar gerando empregos

4 – Ustulin, Edson José - CANA-DE-AÇÚCAR - Proteger o ambiente e continuar gerando empregos

Fonte: Brum & Advogados Associados

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